COMPROMETIMENTO DOS PODERES

As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

PRISÕES POR TRÁFICO CRESCEM 30%, MAS NÃO AFETAM NEGÓCIO ILEGAL

Presídios do país abrigam 138.198 traficantes, 1/4 de todo o contingente em regime fechado, 548.003 presos

JAILTON DE CARVALHO
O GLOBO
Atualizado:14/07/13 - 22h34

Presos em Almadina, sul da Bahia /Agência A Tarde


BRASÍLIA — O número de presos condenados por tráfico de drogas cresceu 30% nos últimos dois anos, índice três vezes maior que o crescimento global da população carcerária do país no mesmo período. Os presídios do país abrigam 138.198 traficantes, um quarto de todo o contingente mantido em regime fechado, 548.003 homens e mulheres. Esses dados não são vistos como uma vitória do Estado contra o narcotráfico. Segundo o juiz Luís Lanfredi, 90% dos presos são pequenos traficantes, sem antecedentes criminais e vínculos com o crime organizado.

A prisão dos “varejistas” do narcotráfico tem pouco impacto sobre o comércio das drogas. Depois de presos, eles são rapidamente substituídos por outros e os negócios seguem no mesmo ritmo. Embora não disponha de dados estatísticos de âmbito nacional sobre a legião de jovens de baixa renda cooptados pelo tráfico, Lanfredi fala com conhecimento de causa. Ele é juiz em São Paulo e integra o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), responsável pelo acompanhamento da situação do sistema carcerário:

— De cada dez presos por tráfico, 7 ou 8 são pequenos traficantes. O número de grandes traficantes presos está abaixo de 10% — disse .

O número de presos condenados por tráfico começou a aumentar a partir de 2006, após a aprovação da nova lei antidrogas. Segundo juízes e especialistas no assunto, as novas regras, aparentemente mais flexíveis, facilitam a prisão e a condenação de quem, de alguma forma, se envolve com a venda de drogas. A pena mínima para o tráfico subiu de 3 para 5 anos, o que inviabiliza a aplicação de penas alternativas à cadeia.

A partir daí, o exército de presos condenados por tráfico e cumprindo pena em regime fechado não parou de crescer. Em 2010, os presídios brasileiros tinham 106.491 pessoas fisgadas na guerra contra o narcotráfico. Dois anos depois, esse número pulou para 138.198. Os dados constam do último levantamento do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) sobre o assunto concluído em dezembro do ano passado.

No mesmo período, entre 2010 e 2012, a população carcerária passou de 496.251 para 548.003 detentos: um salto de 10%. Esse é um número considerado alto, mas, ainda assim, três vezes inferior ao crescimento de condenados por tráfico. O contingente de presos por tráfico é 30% superior ao de assaltantes que cumprem pena em regime fechado. Assaltantes formam o segundo grupo mais numeroso nas prisões.

O aumento de presos por tráfico não produziu os efeitos esperados. Mesmo com os presídios abarrotados de pequenos traficantes, a circulação das drogas permanece intacta. O mais recente relatório do Escritório sobre Drogas e Crimes da ONU, divulgado em junho, aponta o crescimento das taxas consumo de maconha e cocaína no país.

— A situação tem se agravado muito nos últimos anos — diz o advogado Pedro Abramovay, que, no início do governo Dilma Rousseff, foi indicado para ser secretário nacional Antidrogas.

Ele não chegou a assumir o cargo por causa de uma entrevista ao GLOBO, na qual defendeu mudança na lei antidrogas. Três anos após o episódio, Abramovay mantém o ponto de vista. Para ele, é um equívoco abarrotar as prisões com pessoas sem vínculo com o crime organizado, e pequenos traficantes deveriam ser punidos com penas alternativas à prisão:

— Quando as pessoas vão para a cadeia, se elas não têm ligação com o crime organizado, passam a ter. Isso devolve para a sociedade pessoas ainda mais violentas — argumenta.

As discussões sobre mudanças na lei foram suspensas no governo desde o episódio com Abramovay. A ex-secretária Paulina Duarte, que esteve no cargo até o início deste ano, deixou de lado o tema para não entrar em choque com as linhas gerais da política ditada pelo Planalto. A presidente Dilma Roussseff já se classificou como uma “conservadora” nessa questão.

O tema se tornou mais delicado com o crescimento da influência dos evangélicos, cada vez mais atuantes em políticas públicas sobre comportamento, desde a última eleição presidencial. Secretário nacional Antidrogas desde abril, Vitore Maximiano nega que a política nacional sobre a questão tenha fracassado, embora considere elevado o número de presos por tráfico.

Maximiano diz que não é preciso mudar a lei. Para o secretário, a legislação já permite que juízes reduzam as penas de quem tiver envolvimento eventual com o tráfico, mas sem apresentar antecedentes criminais:

— Temos cobrado do Judiciário a ação desse dispositivo, que já faz a distinção de quem é um pequeno traficante, um agente primário, que não tem antecedentes. Diferente daquele que tem ligação com a organização criminosa.

O secretário diz que os policiais devem investir em ações de inteligência, para prender os chefes do tráfico. Frisa que dois terços dos presos são capturados em policiamento de rotina, e não a partir de investigações sobre a circulação das drogas — prendendo só os varejistas que estão nas ruas, e não os donos do negócio.

‘Condenados são pequenos traficantes’, diz juiz. Magistrado afirma que número de condenados por delitos relacionados às drogas cresceu significativamente

BRASÍLIA — Juiz da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, Bruno André Ribeiro diz que é falsa a ideia de os presídios estarem abarrotados de perigosos traficantes.

O número de presos por tráfico é grande ou pequeno, comparado ao de presos por outros crimes como roubo e latrocínio?

Certamente, é bastante elevado, apenas equiparado ao quantitativo de presos condenados por crimes contra o patrimônio (furto e roubo, principalmente). Os apenados por crimes de homicídio e latrocínio não representam um quantitativo significativo, comparativamente à grande massa, composta por crimes relacionados às drogas e ao patrimônio.

O número de presos por tráfico cresceu nos últimos anos? A situação é preocupante?

O número de condenados por delitos relacionados às drogas cresceu significativamente. Isso se deve às políticas públicas na área de segurança que, dentro da estratégia bélica de combate às drogas, têm aumentado a repressão. Inclusive, quanto ao consumidor, houve um endurecimento de fato. Muitos usuários têm sido recolhidos ao sistema prisional apenas com base na autuação a título precário, levada a efeito pela polícia, no momento da lavratura do auto de prisão em flagrante. Apenas quando há a audiência a situação é efetivamente esclarecida e o usuário, solto.

Quem são os condenados por tráfico? A maioria deles é formada por pequenos traficantes?

Sim, em sua grande maioria. Normalmente, imagina-se que os presídios estão lotados de traficantes com alto grau de periculosidade. Precisamos compreender que faz parte dessa “guerra” contra às drogas firmar na consciência de todos essa falsa percepção. A maior parte dos condenados por crimes de drogas, ao menos na VEP-DF, corresponde a pequenos traficantes, sendo muitos usuários que, na dúvida, foram seletivamente autuados, denunciados e condenados por tráfico. O retrato dos condenados fala por si. No meio de um ou outro “barão do tráfico”, temos outros milhares de jovens pobres que não se inserem no propalado e temido perfil do traficante.

O que os juízes da VEP pensam sobre a legislação contra as drogas ? É eficaz ou não?

Não posso falar pelos demais colegas, mas acredito que há necessidade de se buscar uma mudança de paradigma. Isso não é fácil. Mas não podemos continuar alimentando o imaginário popular de que segurança pública é sinônimo de prisão. Nunca se prendeu tanto na história. Os presídios estão abarrotados, tanto de presos provisórios como definitivos. No entanto, se o objetivo era identificar o problema social e buscar alternativas, particulares e gerais, não há como não reconhecer que a política é completamente ineficaz.

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