COMPROMETIMENTO DOS PODERES

As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O DILEMA DO CRACK

ZERO HORA 21 de dezembro de 2012 | N° 17290

EDITORIAIS


Divide a opinião pública o pedido da mãe de uma mulher dependente de crack para que a Justiça determine a esterilização compulsória da filha. A requerente argumenta que já cuida de três filhos da dependente química e vê na laqueadura tubária involuntária a possibilidade de evitar novas gestações indesejadas. Um dilema com potencial para provocar tanta polêmica teria muito menos chance de assumir essas proporções se vítimas e familiares já pudessem contar com uma rede mínima de assistência a quem, por alguma razão, se escravizou à droga e dificilmente poderá se livrar dela sem ajuda profissional.

O caso concreto registrado em Passo Fundo é consequência direta da disseminação de uma droga letal que contamina a sociedade brasileira. Por mais que pareça adequado prevenir a geração de mais crianças condenadas à miséria e sem a figura da mãe, o poder público não pode restringir os direitos individuais de uma pessoa considerada capaz – o que precisa ser avaliado por especialistas no caso da dependente. Mas o poder público tem o direito, sim, e também o dever, de internar até compulsoriamente a mãe dominada pelo vício, para que ela possa se recuperar e voltar a cuidar dos próprios filhos. Apelar para a laqueadura e deixar a mulher entregue à dependência seria uma capitulação à droga.

Quem, por alguma razão, convive no cotidiano com dependentes de drogas fortes como o crack sabe o quanto, na maioria das vezes, não há qualquer capacidade de discernimento entre essas pessoas. Exigir delas, portanto, que optem por se internar ou não para tratamento especializado ou que definam quantos filhos querem ter só serve para agravar ainda mais o sofrimento que o consumo de droga espalha à sua volta.

As instituições de defesa dos interesses dos cidadãos precisam reforçar a luta por mais atenção aos dependentes e familiares. É inadmissível que, tanto tempo depois de o crack ter se transformado em calamidade, a prometida estrutura de atendimento continue praticamente inexistente.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

ATÉ QUANDO?


ZERO HORA 20 de dezembro de 2012 | N° 17289. ARTIGOS


Maria Regina Fay de Azambuja*


Até quando seremos omissos frente ao que se passa com os jovens? Refiro-me à omissão quanto a um posicionamento firme e claro por parte dos pais, da família e do poder público no que diz respeito à relação que a sociedade atual tem impingido a todos: para festejar e comemorar, é preciso fazer uso do álcool.

Alguns leitores podem estar imaginando que estamos a falar da cerveja. Engano. É muito pior. Bebidas mais fortes, em grande quantidade e misturas de bebidas integram o cenário das comemorações dos jovens. Não sabem o que bebem e talvez não saibam por que bebem. Mas bebem, pois beber antecede a comemoração. Faz parte de um ritual responsável por muitos danos à saúde mental, física e social que se inicia muito cedo e que os expõe a uma situação de extrema vulnerabilidade, como tem sido possível constatar nas formaturas deste final de 2012.

O Fórum Permanente de Prevenção ao uso e à venda de álcool por crianças e adolescentes, que envolve inúmeros parceiros, ao longo deste ano que já se vai, trabalhou, de forma intensiva, com várias instituições públicas e privadas, entre as quais se incluem escolas e pais, buscando imprimir a ideia de que formaturas saudáveis proporcionam memórias felizes. Temos presenciado que grande parte dos jovens que desejavam comemorar sua formatura não pôde lá permanecer. O uso do álcool, sem qualquer controle, é o responsável pelas memórias desagradáveis que certamente carregarão consigo juntamente com o lamento de que é direito seu estar na sua festa de formatura.

Até quando nos manteremos omissos e coniventes com este descontrole que tanto tem prejudicado os jovens? É preciso enfrentar o caos que ajudamos a construir, buscando oferecer proteção àqueles que ainda não atingiram 18 anos. Neste mês de dezembro, Ministério Público, EPTC, Smic, BM, equipes de saúde, grupos de pais, organizações não governamentais, diferente do que ocorria nos anos anteriores, estão presentes nos locais das festas de formatura com o propósito de proteger os adolescentes e aplicar a lei. É possível afirmar que, se lá não estivéssemos, os danos poderiam ser maiores e, quem sabe, irreversíveis. O Fórum conclama todos a enfrentar a cultura da falta de limites, oferecendo proteção aos jovens, fazendo valer o Estatuto da Criança e do Adolescente!

*PROCURADORA DE JUSTIÇA, PROFESSORA NA FACULDADE DE DIREITO DA PUCRS

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

CRACOLÂNDIAS NÃO DEMARCADAS E PERIGOSAS

JORNAL EXTRA 18/12/12 06:00

Zonas Norte e Oeste têm cracolândias fora da lista de ações da Prefeitura do Rio

Usuários de crack no prédio da antiga delegacia de Realengo, na Zona Oeste do Rio: invasão Foto: Fabiano Rocha / Extra

Carolina Heringer e Paolla Serra


Quinta-feira, 6 de dezembro, 14h10m, Avenida Pastor Martin Luther King Junior, altura da Pavuna. O vai e vem de pessoas, carros e ônibus não para. Exceto na saída da estação Rubens Paiva do metrô. Ali, poucos pedestres passam. Dois grupos, num total de onze pessoas, fumam crack livremente. Parecem não se importar com os vizinhos. O local é um dos pontos de consumo da droga — conhecidos como cracolândias — esquecidos pela sociedade e quase sem atenção do poder público.

O EXTRA mapeia nesta terça-feira, no segundo capítulo da série "Os mitos do crack", onde estão as cracolândias do Rio, mostrando que elas vão além das já conhecidas como as de Madureira, Ilha do Governador e Parque União, na Zona Norte alvos de operações constantes da prefeitura.

Assim como na Pavuna, em Realengo uma equipe do jornal flagrou pouco mais de uma dezena de usuários consumindo a droga no antigo prédio da 33ª DP, a delegacia da área. O prédio já foi fechado com tijolos, mas os viciados acabam retornando.

Em Santa Cruz, na Zona Oeste, a cena se repete em duas favelas do bairro. Apesar dessa realidade, na lista de operações da Secretaria municipal de Assistência Social, esses locais não aparecem entre os pontos de atuação dos agentes ou de acolhimento de usuários.

— Eles vagam pelas ruas, dia e noite — relata uma vendedora, na Pavuna, mostrando que quem está por ali conhece bem a realidade.





Em 2012, dos quase 3 mil acolhimentos na cidade, apenas 16 foram em Realengo e Padre Miguel. Já Pavuna e Santa Cruz nem aparecem na lista. A secretaria, no entanto, garante que faz operações nos bairros. Em contraste com o abandono, a cracolândia do Parque União concentrou 44% dos usuários acolhidos em operações da prefeitura. Foram 1.274, de um total de 2.924 na cidade. Ainda assim, o problema perdura. Na última sexta-feira, um grupo de cerca de cem usuários se aglomerava na entrada da comunidade.

No Jacarezinho, apesar da recente ocupação policial, os viciados também ainda são vistos. Ali, o consumo acontece de forma mais velada.

As digitais de um usuário de crack: falhas nos dedos causadas pelas queimaduras na hora de acender a pedra
 Foto: Roberto Moreyra / Extra



Sexta-feira, 30 de novembro, 9h, Rua Honório Hermeto. Pela terceira vez, Matheus da Silva Salviana, de 18 anos, arrombou as grades da janela de uma casa. Entrou no imóvel e roubou R$ 100. Após ser capturado, na 39ª DP (Pavuna), uma espera dramática para vítima e policiais: depois de confessar o crime, o acusado, sem documentos, não lembrava seu nome. E também não tinha impressões digitais identificáveis — situação frequente, segundo os investigadores.

— Pela proximidade com a chama, os usuários ficam com as mãos queimadas e, por causa do isqueiro, cheias de calos. Mas acredito que a perda da digital seja temporária — opina a psiquiatra Maria Thereza de Aquino.

Numa comparação das digitais de Matheus com a de um preso não-viciado na pedra, as diferenças são nítidas: faltam pedaços nas extremidades do dependente da droga. Dos quatro registros de furto e roubo a residência feitos naquele dia na Pavuna, três tinham usuários de crack como autores.

Sobre o esquecimento do próprio nome, Analice Gigliotti, chefe do Departamento de Dependentes Químicos da Santa Casa de Misericórdia, explica que, intoxicado, o usuário pode ter “turvamento da consciência”.

Matheus: preso por roubo na Pavuna, ele não se lembrava nem do próprio nome Foto: Roberto Moreyra / Extra

O crack e o crime

Os roubos a transeuntes aumentaram 17% na área da 39ª DP (Pavuna) de janeiro a setembro deste ano em relação a 2011, sobretudo nas regiões do metrô e da antiga rodoviária. Desde maio, 15% dos presos na delegacia cometeram os crimes por causa do envolvimento com crack. Sem dinheiro para bancar o vício, os dependentes furtam, roubam e até invadem casas em busca de qualquer moeda de troca.

— Ainda que se restrinja o acesso a droga, o usuário faz de tudo para obtê-la — afirma o delegado Fernando Reis, do Departamento Geral de Polícia Especializada.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

A MACONHA FAZ PARTE DA ARMADILHA

FOLHA.COM 12/12/2012 - 03h30. Tendências/Debates:


RICARDO SAYEG


A pretensa tendência de liberalização da maconha é um atentado contra todos. As drogas, inclusive a maconha, não devem ser nem sequer descriminalizadas. O seu uso pessoal extrapola as liberdades da intimidade e da vida privada das pessoas, por ser questão de saúde pública.

De fato, é certo que o usuário de drogas não é um bandido. Antes de tudo, é vítima. A sociedade atual, voltada ao consumo material e às mídias massificadoras, sujeita as pessoas à desintegração das relações humanas e familiares, bem como ao vazio de sentido, propósitos e ideais.

Os antropólogos falam da era do vazio, da era da decepção, da sociedade líquida, da antropologia da solidão. Para o desespero de Fernando Pessoa, se depender da sociedade atual, a alma será pequena.

Na pequenez da alma, a terrível armadilha moderna, que está à espreita das pessoas, em especial dos jovens e mesmo das crianças: o uso pessoal de drogas, que joga o ser humano numa espiral para baixo, abrindo as portas da dor e da ruína.

A droga acabou com as pessoas e com seus cérebros, arruinou sua dignidade, capturou suas almas, as conduziu para a criminalidade. No fim do poço, transformou-as naqueles zumbis da cracolândia, em condições infra-humanas.

Dói só de pensar nas crianças recém-nascidas, filhas das mães do crack, sofrendo crise de abstinência e já com sequelas gravíssimas.

Errado dizer que a a maconha não faz parte desta armadilha. Faz.

Está comprovado que ela não é inofensiva. Aliás, o Levantamento Nacional sobre Drogas de 2010 é alarmante e demonstrou que tem relevância estatística o uso de drogas por crianças a partir de dez anos. Mostrou também que quem usa uma droga geralmente acaba usando qualquer outra.

Não há humanismo em tolerar o uso pessoal de drogas. Ser indiferente ao uso próprio de drogas e deixá-lo ao critério da opção pessoal de cada um, especialmente por criar fácil acesso a jovens e crianças, é ser indiferente à saúde pública e na prática a todas essas vítimas que entregaram a sua dignidade.

Inegável que a capacidade de discernimento do usuário fica prejudicada --e não é ele, por si, que terá lucidez e força para pedir ajuda. Há quem defenda que se deve deixar as pessoas chegarem ao fundo do poço. Mas não dá para se omitir.

Para piorar, o usuário de drogas acaba sendo refém do traficante e, ao fim e ao cabo, financia e contribui para a indústria do tráfico, na condição de consumidor final. Crime, violência e morte, tudo isso escrito pelo vermelho do sangue das vítimas, está intimamente relacionado ao império das drogas.

Assim, o problema do uso próprio de drogas nunca é íntimo e privado, ainda que o consumo seja pessoal, íntimo e privado. É um problema grave e deve ser prioritariamente enfrentado pelas autoridades, com profundo respeito e consideração pelas famílias e vítimas desse mal.

Isto é, mesmo o uso pessoal, íntimo e privado das drogas é um problema coletivo de saúde pública que merece resposta penal. Logo, não é o caso de descriminalizar. Não para vigiar e punir, como diria Foucault, mas para cuidar e desintoxicar, ainda que compulsoriamente.

Significa que os usuários não deviam ser colocados na cadeia, muito pelo contrário, como problema de saúde pública, a resposta penal para o uso pessoal das drogas deve ser, como é, o encaminhamento para compulsório tratamento médico e desintoxicação.

RICARDO SAYEG, 45, advogado, é professor livre-docente de direito econômico da PUC-SP. É também coordenador de doutorado e mestrado e líder do grupo de pesquisa do capitalismo humanista

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

FAMÍLIA TRUCIDADA


ZERO HORA 10 de dezembro de 2012 | N° 17279

Homem mata pai, mãe, irmã e sobrinho a marteladas em SC


Um homem de 38 anos confessou ter matado o pai, a mãe, uma irmã e um sobrinho a golpes de martelo, em Penha, litoral norte de Santa Catarina.

O aposentado Luiz Nilo Flores, 72 anos, sua filha Leopoldina Carmem Flores, 41 anos, e o pequeno Pedro Henrique Flores, 10 anos, filho de Leopoldina, foram assassinados dentro de casa, na noite de sexta-feira. Já a mulher de Luiz, Carmem Cunha Flores, 69 anos, foi encontrada morta em uma vala próxima à residência, localizada na Rua Tijucas. Conforme o delegado Rodolfo Farah Valente Filho, Flores confessou o crime.

De acordo com o delegado, o assassino estaria sob efeito de drogas quando golpeou os quatro familiares com um martelo.

A comunidade está em choque com a violência do crime. Os quatro corpos apresentavam lesões de afundamento de crânio, provocadas pelos golpes.

A cerimônia de despedida, realizada na Igreja de São Judas Tadeu, no bairro Armação, atraiu centenas de pessoas. O altar do templo foi tomado pelas coroas.

A brutalidade das execuções impediu que os caixões fossem abertos. Sobre três deles foram colocadas fotos recentes das vítimas. Sobre o esquife de Pedro Henrique, o retrato escolhido foi tirado durante a primeira comunhão do garoto, realiza há poucos dias.

domingo, 9 de dezembro de 2012

ÁLCOOL ABAIXO DOS 18

 


 



ZERO HORA 9 de dezembro de 2012 | N° 17278


Adolescentes e a pré-festa

LETÍCIA COSTA*


O gosto pode não ser o melhor, mas a sensação de que tudo ficou mais divertido empolga. E assim muitos adolescentes começam a consumir bebidas alcoólicas. Durante três madrugadas, ZH circulou por alguns pontos da Capital para constatar os hábitos dessa geração nascida após 1995.

Cerveja, uísque e vodca com refrigerante, suco de fruta ou energético. O rol de bebidas alcoólicas faz parte de um cardápio conhecido dos adolescentes. O gosto não importa e normalmente não atrai, mas a sensação de que a timidez foi embora e de que tudo se tornou mais engraçado garante o sacrifício de ingerir algo repudiado pelo próprio paladar.

Um passeio noturno pela Capital em uma sexta-feira à noite torna-se revelador quanto aos hábitos de jovens em busca de diversão. Por três madrugadas, Zero Hora percorreu alguns pontos da cidade para constatar os costumes dessa geração com menos de 18 anos.

Animados pelo efeito dos drinques, adolescentes indicam as opções para burlar leis que impedem a venda de bebida para quem ainda não chegou à almejada maior idade. A missão é fácil de ser cumprida e, às vezes, conta com a ajuda de pais, de um amigo nascido antes de 1995 e até mesmo de taxistas. Com exceção de algumas casas de festa, o acesso à bebida em bares e postos de combustíveis é praticamente livre. Para garantir o consumo dentro da balada, onde pulseiras indicam a permissão ou não da compra, alguns se arriscam e falsificam carteiras de identidade.

“Esquentas” ou “concentras” fazem parte do vocabulário festivo. É na junção com os amigos que a noite começa e, dependendo da empolgação, termina, sem nem mesmo entrar nas festas. Na maioria dos casos, a preparação ocorre nas casas dos amigos, onde residem pais “mais liberais”. A segunda opção, bastante vista em Porto Alegre, é se concentrar em frente às danceterias e por ali ficar. Foi o que fez o grupo de Gustavo, 17 anos, que usava o chão de pedra do estacionamento de um shopping como mesa, e o meio-fio como cadeira para tomar cachaça. Ele começou a beber há dois anos e afirma que quando a festa não tem bebida, fica por menos tempo no local.

É quase consenso entre adolescentes de que algum porre os ensinou o limite da bebida. As gurias não precisam de muito para ficar mais soltas, já a maioria dos guris só para quando o corpo não suporta mais.

Pedro, 14 anos, conta que a bebedeira foi, de certa forma, importante:

– Acredito que o porre tenha sido necessário para que eu pudesse conhecer os meus limites.

O exagero é visto como algo normal nas primeiras experiências, quase um aprendizado. Praticando, e como disse Felipe Braun, 20 anos, vomitando muito, é que se conhece a hora de parar.

Matar aula para beber

As amigas Roberta, 17 anos, e Vitória, 15 anos, comentam que colegas têm levado a bebida alcoólica para além do ambiente das festas. Durante a semana, em plena luz do dia, adolescentes matam aula para consumir cerveja.

– Tem gente que está tão dependente que se reúne para beber à tarde. Com o decorrer do tempo começa a virar um vício – acredita Vitória.

Sou bem tímida, bebo só para ficar meio soltinha.

*Colaborou Bruna Scirea


Um tabu ainda existente


Fingir não saber de nada ou liberar e ajudar os filhos a terem acesso às bebidas alcoólicas. Qual a melhor opção? Divididos, pais apresentam características diferentes, normalmente atreladas à própria criação, de décadas atrás. A maioria, na avaliação dos filhos, prefere simular que não sabe de nada, mas na verdade tem conhecimento de que os herdeiros já experimentaram o gosto do álcool.

Do outro lado, estão os liberais, que abrem a casa e compram as bebidas para os famosos esquentas da turma dos filhos. Mas, como em todas as situações, existe o meio termo. Formado por pais que sabem que os filhos bebem, mas não oferecem o lar para a confraternização com toques alcoólicos, esse grupo tem um limite: ver o filho passando mal de tão bêbado.

– Gostaria que não bebessem, mas o mundo é esse. Se não trouxermos o filho para o nosso lado é pior, porque fazem na rua, sem nosso consentimento – diz a mãe de Vitória, 15 anos.

Com um filho mais velho, ela acredita que o método usado na criação tem dado certo, pois nunca viu nenhum dos herdeiros chegar da rua em condições preocupantes. No momento em que vir, garante que irá proibir. Enquanto isso, até oferece goles de caipirinha para a filha em ocasiões especiais.


ENTREVISTA

“Quando o jovem usa o álcool como mecanismo de superação, começa um grande risco” - Alberto Scofano Mainieri - Hebiatra (especialista em adolescentes) e professor da Faculdade de Medicina da UFRGS



Ao apontar as mudanças características deste período de transformação do corpo e dos conceitos pessoais, o médico especializado em atendimento de adolescentes, Alberto Scofano Mainieri, explica o porquê da necessidade que eles têm de ingerir álcool. Confira alguns trechos:

Zero Hora – Na maioria das vezes, o gosto da bebida alcoólica não atrai os adolescentes. O que os leva a beber mesmo assim?

Alberto Scofano Mainieri – A necessidade de fazer coisas que adultos fazem e a necessidade de ser aceito pelo grupo, de superar os medos e de quebrar as regras. Também tem a influência da mídia, da família.

ZH – A partir de que ponto a relação com a bebida pode ser analisada como dependência?

Mainieri – Toda vez que um jovem está utilizando o álcool como mecanismo de superação começa um grande risco. Quando está usando mais como uma forma social, na diversão, o risco é um pouco menor, mas pode acabar gostando e mantendo o hábito.

ZH – Médicos apontam que a ingestão de álcool na adolescência (quando o cérebro ainda está em período de formação) mata neurônios responsáveis pela memória. Na sua opinião, qual o principal perigo do consumo em excesso nesta fase?

Mainieri – Do ponto de vista neurológico e intelectual, é a questão da formação do cérebro. A parte frontal, que cuida do juízo crítico, só chega a sua plenitude em torno dos 16 anos. Se a pessoa inicia o consumo de bebida alcoólica antes dos 16 anos, sem dúvida estará causando algum grau variável de lesão, de comprometimento da sua capacidade intelectual.



Jorge Bengochea Este problema seria minimizado se o Brasil seguisse o exemplo de outros países que proibiram o consumo de bebida alcoólica em local público.



sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

LIVRES PARA O TRÁFICO


PERTO DA LIBERDADE -- Como este rapaz, de 17 anos internado na Fundação Casa, milhares de jovens traficantes agora ganharão as ruas (Foto: Jefferson Coppola)
REVISTA VEJA | BRASIL, Edição 2284 de 29/08/2012

CAROLINA RANGEL

O STJ determina que jovens menores de 18 anos não poderão ser internados se forem pegos vendendo drogas pela primeira vez

Traficantes de drogas com menos de 18 anos só poderão ser internados depois que tiverem sido pegos ao menos três vezes cometendo crimes, decidiu o Superior Tribunal de Justiça. A corte seguiu à risca um artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e consolidou um entendimento da lei que, na prática: 1) ameaça despejar milhares de marginais precoces de volta às ruas e 2) aumenta exponencialmente as vantagens, para os traficantes, de recrutar adolescentes para o crime. A decisão tem base legal: o ECA determina que a internação de menores de idade só pode acontecer em três hipóteses: se o jovem cometeu infrações graves anteriormente (aqui entram roubo e furto, por exemplo); se ele usou de violência; ou se descumpriu medida socioeducativa (como trabalho comunitário). Essa decisão do STJ deverá agora orientar os tribunais inferiores quando eles forem julgar casos que envolvam traficantes adolescentes.

O artigo do ECA tem o bom propósito de só privar os jovens da liberdade em último caso — e, assim, protegê-los do contato nocivo com criminosos reincidentes. Ocorre que ele pressupõe que, no lugar da internação, os juizes possam lançar mão de penas alternativas, como a liberdade assistida (com acompanhamento de um assistente social) ou o trabalho comunitário — ambas de responsabilidade das prefeituras. Na maior parte do Brasil, no entanto, elas não passam de ficção, segundo comprovou uma pesquisa recente do Conselho Nacional de Justiça. Assim, apesar de a lei oferecer opções, na vida real os juizes têm só duas escolhas: a internação ou a impunidade. Pautados por essa realidade, muitos decidiam pela punição mais severa, com o justo argumento de que o tráfico de drogas é um crime grave por representar uma ameaça à integridade da sociedade. Essa saída agora está bloqueada pela súmula do STJ.

Não há dúvidas de que a decisão levará a um aumento imediato do número de jovens envolvidos com o tráfico. Para os chefões do crime, a mão de obra adolescente, agora com a expectativa da impunidade, parecerá ainda mais vantajosa. “Os menores são o principal canal de venda de drogas: são fáceis, baratos e, agora, impunes. Essa súmula pode estar juridicamente perfeita, mas vai aumentar o número de jovens no crime organizado”, afirma o procurador de Justiça de São Paulo Márcio Sérgio Christino. Mesmo quem defende uma segunda chance para os jovens criminosos, como o sociólogo Guaracy Mingardi, acredita que a lei terá um efeito nefasto, inclusive sobre eles. “Há que levar em conta que grande parte dos jovens que sofrem internações viram profissionais do crime. Mas também é preciso observar que essa súmula fará com que os jovens se sintam sem limites. E isso aumentará a sua participação no tráfico.” Uma visita à Fundação Casa (antiga Febem) mostra que essa participação já é assustadoramente alta. Na instituição, que abriga a maior parte dos menores infratores detidos do país, o número de internações por tráfico triplicou de 2006 para cá: saltou de 1180 para 3 740 em 2012. Agora, com a decisão do STJ, ele vai cair. Mas a que preço.

O PERIGO DOS NARCOVIZINHOS

REVISTA VEJA, EDIÇÃO 2285 , de 5/09/2012

Entrevista DOUGLAS FARAH

por Duda Teixeira



O consultor de segurança americano diz que o Brasil é um dos maiores prejudicados pela aliança que os governos de países da América Latina estabeleceram com traficantes

Douglas Farah é pago para redigir relatórios de segurança para empresas privadas e órgãos do governo americano, como o Departamento de Segurança Interna e o Departamento de Defesa. Membro do Centro de Avaliação Estratégica Internacional (Iasc), de Washington, o consultor americano é especialista em identificar as áreas de influência de cartéis mexicanos, gangues salvadorenhas e grupos terroristas na América Latina. Também revela as armas, os centros de lavagem de dinheiro e os contatos no governo e na Justiça usados por esses criminosos. Autor do livro Merchant of Death (O Mercador da Morte), sobre o traficante de armas russo Viktor Bout, Farah foi criado na Bolívia, onde seus pais, missionários americanos, trabalharam.

Como explicar o avanço do crime organizado na América Latina?

Depois dos atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova York, os governos dos Estados Unidos e de países da Europa concentraram suas atenções no islamismo radical e no terrorismo. Desde então, o combate ao crime organizado ficou de fora da lista de prioridades e diferentes grupos com atividades ilícitas puderam agir com uma liberdade sem precedentes. Eles fizeram contatos entre si e assumiram o controle de panes vitais da economia de muitos países. Na América Latina, houve um fenômeno ainda mais preocupante. Os criminosos foram convidados pelos governantes de países ditos "bolivarianos", liderados pelo presidente venezuelano Hugo Chávez, para compartilhar o poder político. Assim, conquistaram uma força inédita na região.

Como é a parceria entre os governos e os criminosos?

Narcoestado é o nome que se atribui a um país em que a cúpula governamental dá proteção às atividades dos traficantes ou mantém alguma participação direta no negócio clandestino. Nesses lugares, os criminosos são utilizados como instrumento de política interma e externa e apoiam o poder central. Em troca, cometem seus crimes com total segurança. A existência desse tipo de acordo explica o espetacular crescimento do papel da Venezuela como local de passagem da cocaína para outros países. O mesmo ocorreu com o Equador e a Bolívia. Nesses países, quando funcionários do primeiro escalão são flagrados em operações ilegais, jamais são investigados ou punidos. Ao contrário, são promovidos. Quem é castigado nos narcoestados são os jornalistas ou os políticos da oposição com coragem para divulgar as relações entre o poder político e o crime organizado. Foi o que aconteceu com o senador boliviano Roger Pinto, que entregou denúncias ao presidente Evo Morales e, por isso, passou a ser perseguido pelo governo. O político acabou se refugiando na Embaixada do Brasil para escapar da retaliação.

Quais são as principais autoridades envolvidas com narcotraficantes?

São muitas. O ministro da Defesa da Venezuela, Henry Rangel Silva, deu apoio material para que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) transportassem drogas, segundo o Departamento de Tesouro americano. O juiz Eladio Aponte, que trabalhou sete anos no Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela e está exilado nos Estados Unidos, também afirma ter provas do envolvimento de altos membros do governo de Hugo Chávez com narcotraficantes. Até fugir para Miami, ele era fiel ao presidente. Na Bolívia, Juan Ramón Quintana, ministro da Presidência, e Sacha Llorenti, ex-ministro de Governo, são suspeitos de manter relações escusas com o crime organizado. Llorenti acaba de ser nomeado embaixador da Bolívia na ONU. No Equador, dois aliados do presidente Rafael Corrêa. Gustavo Larrea, ex-ministro de Segurança Interma e Externa, e José Ignácio Chauvín, ex-subsecretário de Governo, mantinham vínculos diretos com traficantes das Farc.

O crime organizado sempre procurou infiltrar-se no poder oficial, não?

Sim, mas a natureza desses laços mudou. Tradicionalmente, os cartéis das drogas buscavam instalar-se em setores estratégicos do estado para abrir brechas nas alfândegas e nos postos de imigração, e para controlar alguns tribunais de Justiça. Não se preocupavam em dominar a cúpula nacional. No México ainda é assim. Já nos países bolivarianos o crime organizado espalhou-se de alto a baixo na estrutura de poder. No modelo antigo, sempre havia um setor do estado que não tinha sido contaminado e podia reprimir os criminosos com a polícia ou as Forças Armadas. Nos narcoestados, essa capacidade de reação praticamente deixa de existir.

Como foi forjada a aliança desses governos com os narcotraficantes?

Quando iniciaram o seu mandato, eles não tinham essa ambição. A questão é que o modelo econômico que adotaram não funcionou. Nas empresas nacionalizadas houve uma queda na produção. Os investidores, internos e externos, sumiram. A corrupção se alastrou e os profissionais mais talentosos se mudaram para outros países. Com a economia desmoronando, esses governantes buscaram alternativas. Encontraram o crime organizado.

Como a sociedade brasileira é afetada pelos narcoestados da vizinhança?

O Brasil é o segundo maior mercado consumidor de cocaína do mundo, e conquistou esse posto porque houve uma mudança na forma de pagamento da droga entre os traficantes. Até os anos 80, quando ainda dominavam o tráfico de cocaína, os colombianos recompensavam seus intermediários em dinheiro. Com isso, a maior pane da droga apenas fazia escala no Brasil, de onde era enviada para outros países. Nos anos 90, os mexicanos mudaram as regras e passaram a pagar de 20% a 50% do valor em mercadoria. Isso obrigou seus parceiros em vários países a arrumar uma maneira de vender a cocaína. Assim cresceram os mercados domésticos para a droga e suas variações, como o crack. com o impacto conhecido na criminalidade. Quando um viciado fica sem dinheiro, rouba oi comete outros crimes. Os pontos de venda passam a ser disputados e os bandos começam a se armar com fuzis AK-47 e lançadores de granadas. Quando eles entram em combate com policiais armados apenas com pistolas o desequilíbrio de forças é tremendo. Não há um único caso no mundo em que o crescimento do consumo de drogas ilícitas não tenha sido acompanhado de aumento da criminalidade.

De que maneira a conivência do estado com o tráfico prejudica os cidadãos venezuelanos, bolivianos e equatorianos?

Onde há narcotráfico, há lavagem de dinheiro, tráfico de seres humanos e prostituição. O avanço das atividades ilícitas sempre é acompanhado por surtos de riqueza surpreendentes, que não podem ser explicados pela economia formal. No Panamá, estão sendo construídos arranha-céus que depois ficam totalmente vazios. Trata-se de lavagem de dinheiro pura e simples. Como os donos das construtoras que erguem esses prédios podem trabalhar no prejuízo. acabam competindo deslealmente com as empreiteiras honestas. As atividades econômicas legitimas, portanto, são prejudicadas. Essa distorção ocorreu na Colômbia nos anos 80 e agora é a regra nos países bolivarianos. Será muito difícil reverter essa situação e recuperar a pane legítima da economia, tomando-a apta para competir no mercado global.

Por quê?

Porque os criminosos e seus aliados no poder criam laços, fazem negócios e trocam experiências com outros bandos e com o governo de outras nações. Cria-se assim uma rede internacional de proteção mútua. Se Evo Morales cambaleia no poder. Chávez aterrissa em La Paz com um cheque ou aparece a presidente argentina Cristina Kirchner oferecendo novos projetos. Esses governos já resistiram a vários momentos de aguda crise interna por causa dessa rede de apoio, cuja fachada é a afinidade ideológica. No fim de 2010, quando Chávez ficou sem dinheiro (a economia estava em recessão pelo segundo ano seguido), os chineses lhe deram 20 bilhões de dólares. Em troca, garantiram o abastecimento de petróleo venezuelano por muitos anos. Os novos narcoestados latino-americanos também forjaram uma aliança poderosa com o Irã. Ela é feita de acordos que, embora não tragam benefícios econômicos notáveis, têm um sentido estratégico.

O Irã tem petróleo e está muito longe daqui. Qual é o seu interesse na América Latina?

Um dos objetivos claros do Irã é driblar as sanções internacionais. Na Venezuela, criaram-se instituições financeiras de fachada, como o Banco Internacional de Desenvolvimento, que Chávez sempre disse que não era iraniano. Eu tive acesso aos papéis de sua fundação, contudo, e verifiquei que todos os dezessete diretores eram iranianos. Tinham passaporte e nomes persas. O banco era usado para movimentar o dinheiro das transações internacionais do Irã. especialmente as relacionadas ao seu programa nuclear. Depois que esse esquema foi descoberto. o Irã e a Venezuela inventaram outros. Um deles consiste em criar um fundo binacional, ou seja, uma conta conjunta. supostamente para promover a agricultura, na qual cada país deposita alguns bilhões de dólares. Depois esse fundo simplesmente desaparece e o dinheiro some. É uma maneira de fazer com que o capital iraniano possa circular com um rótulo diferente, com outra denominação de origem. No Equador, os iranianos utilizam bancos nacionais que não funcionam mais, mas ainda existem no papel. Bem mais difícil é saber o que eles querem na Bolívia. Há 140 diplomatas iranianos que oficialmente atuam como assessores comerciais no país, mas o comércio bilateral não passa de alguns poucos milhões de dólares. Não há justificativa para tanto funcionário ligado à embaixada.

O senhor arrisca uma explicação?

Temo que o Irã queira usar a América Latina para ameaçar ou chantagear os Estados Unidos. Os generais venezuelanos carregam nos bolsos um pequeno livro com as doutrinas do Hezbollah, um grupo fundamentalista xiita apoiado pelo Irã. O texto contém a meta de derrubar o império americano com armas de destruição em massa. O intercâmbio com os países bolivarianos serviria, então, para montar um perigoso arsenal, talvez químico ou biológico, no quintal dos americanos.

O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, disse estar disposto a iniciar negociações com as Farc. Quais são as chances de isso dar certo?

Qualquer negociação séria teria de conseguir que as Farc abandonassem o narcotráfico, o que é impossível. Muita gente depende dessa rede que se alastra por todo o planeta. A questão do narcotráfico muito provavelmente ficaria de fora em uma negociação de paz. As lideranças das Farc nunca demonstraram disposição para abrir mão dessa que se tomou sua principal atividade.

O Plano Colômbia, assinado com os Estados Unidos em 1999 com o objetivo de reduzir a produção e o tráfico de cocaína, foi bem-sucedido?

Quem ler as metas que foram escritas no tratado de 1999 poderá concluir que se tratou de um fracasso espetacular. Os dois países previam baixar a exportação de cocaína pela metade e falavam em muitos outros objetivos que ao final não se concretizaram. Fora do papel, o plano fez história. Nos Estados Unidos, o consumo de cocaína caiu mais de 20% em dez anos.

Na Colômbia, o risco de o estado ruir não existe mais. As Farc estão debilitadas e não há mais grandes cartéis com liberdade para fazer seus negócios. Com apoio americano, os colombianos se puseram a trabalhar para fechar as feridas das décadas de confronto com a guerrilha.

Os Estados Unidos financiaram menos de 10% do Plano Colômbia. A maior pane dos recursos veio dos colombianos. que aumentaram os impostos pagos pela própria população para assumir as despesas da guerra interna. Eles reduziram a violência sem fazer nenhum pacto com os narcotraficantes. Demonstraram com isso uma capacidade que ainda falta aos mexicanos. Infelizmente, outros países da região escolheram seguir o rumo oposto.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

ECSTASY E KETAMINA EM FESTA RAVE

ZERO HORA 03 de dezembro de 2012 | N° 17272

PORTO ALEGRE. Ação inibe tráfico em festa

Uma ação conjunta da 2ª DP de São Leopoldo e 1ª DP de Novo Hamburgo acabou com a festa de traficantes que agiam em uma rave no bairro Floresta, na zona norte de Porto Alegre, na madrugada de sábado. Conforme a investigação, coordenada pelo delegado Adriano Nonnenmacher, os traficantes vendiam ecstasy e ketamina. O material foi apreendido.

Apenas nos primeiros minutos da festa, quando os agentes os flagraram, os traficantes já haviam movimentado R$ 600. Os dois homens estavam sendo monitorados já no apartamento que dividiam no centro de São Leopoldo.

– Eles mantinham diversas formas para vender a droga. Por vezes, abordavam diretamente o usuário, mas também vendiam drogas sintéticas em casa ou por encomenda, com mensagens por telefone. Eles ainda distribuíam drogas a traficantes menores – explicou o delegado.

O que chamou a atenção dos investigadores foram os códigos usados pelo grupo nas redes sociais nos dias que antecediam as festas eletrônicas. Para anunciar a droga, avisavam: “Vou levar bombom na festa”, ou ainda “a minha bomboniére está cheia”, ou “tem doce hoje na festa”.


PAROBÉ - Droga em carro

O Comando Rodoviário apreendeu, no sábado, 50 quilos de maconha em Parobé, no Vale do Paranhana. Uma barreira havia sido montada a partir de uma investigação da Polícia Civil. A droga foi encontrada em um Uno com placas de Teutônia. O suspeito no outro carro, um modelo 206, tentou fugir, mas foi interceptado. Três pessoas foram presas.

sábado, 1 de dezembro de 2012

QUE PENINHA!

O SUL, Porto Alegre, Sexta-feira, 30 de Novembro de 2012.



BEATRIZ FAGUNDES 


Os supostos traficantes foram "torturados"? Que peninha! E quanto às mães e famílias torturadas pelos zumbis produzidos pelos traficantes, será que o Estado vai agir com a mesma agilidade? Não compactuo com a tortura. Mas, também não suporto a hipocrisia. Vamos liberar as drogas e com isso eliminar os traficantes. Que tal?


Acompanhei a via crucis de um casal de aposentados cujo neto, ainda no segundo grau, se tornou um dependente químico. Um drogado. Os avós, em uma noite qualquer do ano de 2009, ao atenderem a campainha de seu apartamento, foram surpreendidos por dois "meninos armados" que lá estavam para cobrar uma dívida de drogas de seu único e amado neto. Depois daquela noite, a vida daquele casal virou um inferno. O avô sucumbiu em uma madrugada de fevereiro de 2011, vítima de um infarte. "Fugiu do problema", como se queixa até hoje sua fiel companheira, que vive sob tortura permanente, 24 horas por dia, sete dias por semana, 30 dias por mês e 365 dias por ano. A tortura de assistir a degradação física e emocional daquele, hoje homem, que um dia foi criança, adolescente cheio de projetos, filho de sua filha, que morreu quando o menino tinha 4 anos em um acidente de trânsito.


A realidade dessa cidadã brasileira, acompanhada de perto por conhecidos, como eu, impotentes diante do quadro degradante e assustador, não é única, nem a primeira e nem sequer a última. Milhões de famílias vivem mergulhadas nesse inferno real e aparentemente sem porta de saída. O neto já roubou quase a totalidade dos objetos do apartamento da avó, sequestrada pelo medo e pela legislação calhorda brasileira que, desde a incensada Constituição de 1988, garantiu "direitos" absolutos àqueles que decidem viver à margem da civilização tal qual a conhecemos. Lembrei o caso dessa infeliz criatura, que perambula pelo condomínio como um zumbi permanentemente aguardando a presença do pobre neto, hoje transformado em um rascunho de gente, ao ler sobre o delegado de Gramado, Gustavo Celiberto Barcellos, e dois agentes da delegacia de polícia do município serrano, que foram indiciados por tortura, abuso de autoridade e prevaricação durante a prisão de supostos traficantes.


O inquérito da Cogepol (Corregedoria-Geral da Polícia Civil) foi entregue ao Judiciário na semana passada. Uma cópia do documento também foi entregue ao Conselho Superior de Polícia. O grupo de nove pessoas foi preso em novembro de 2011. Os acusados teriam sido torturados com um aparelho de choque para revelarem a localização dos líderes e dos entorpecentes. O caso foi levado até a corregedoria pelo advogado de um dos suspeitos de tráfico, que fez denúncia ao Ministério Público. Barcellos argumentou que não ocorreram agressões e que a denúncia tem a intenção de enfraquecer a ação policial. "Nada disso ocorreu. O advogado dos réus tenta descaracterizar as robustas provas que levaram cinco traficantes para a prisão", frisou. Conforme o delegado, o inquérito é baseado nos depoimentos dos próprios criminosos e em laudos médicos contraditórios. "Fiz mais de 60 prisões de traficantes e nunca houve esse tipo de denúncia. Temos muitas provas a nosso favor", afirmou.


Segundo ele, a investigação não permitiu que a defesa tivesse acesso ao inquérito. "Os policiais e eu tivemos cerceado nosso direito de defesa", garantiu. Se o delegado acusado fala a verdade, eles não tiveram o direito pleno de defesa. E ocupo esse espaço para deixar registrada minha indignação e uma profunda revolta contra o uso de uma legislação que privilegia descaradamente traficantes, estupradores, ladrões e assassinos, para constranger o trabalho de policiais que, com deficiência de equipamentos e baixos salários, tem o dever de enfrentar marginais fortemente armados, patrocinados pelo dinheiro de nossos próprios filhos e filhas! Os supostos traficantes foram "torturados"? Que peninha! E quanto às mães e famílias torturadas pelos zumbis produzidos pelos traficantes, será que o Estado vai agir com a mesma agilidade? Não compactuo com a tortura. Mas, também não suporto a hipocrisia. Vamos liberar as drogas e com isso eliminar os traficantes. Que tal?

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

AÇÃO SOCIAL AFASTA JOVENS DAS DROGAS



ZERO HORA 28 de novembro de 2012 | N° 17267

NÃO À VIOLÊNCIA

Projeto na Capital é exemplo contra um dos principais fatores de criminalidade


CAROLINA ROCHA E EDUARDO TORRES


A Região Metropolitana de Porto Alegre e o Vale do Sinos, com 1.024 homicídios em 2012, tem índice de violência três vezes maior do que o tolerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo levantamento do jornal Diário Gaúcho em 19 cidades, o número de mortes já é 12% superior ao registrado no ano passado. Mas o que pode ser feito para combater a criminalidade? Uma iniciativa na zona sul de Porto Alegre é um bom exemplo de como afastar crianças e jovens das drogas – presente em cerca de 70% das mortes, conforme a polícia.

Num triângulo formado por ruas dominadas por três gangues – os Madeireiras, os Miltons e os Evangelistas – está um prédio grafitado onde nasceu um fio de esperança para os jovens que moram no bairro Restinga.

– Há seis meses, os tiroteios eram diários. Agora cessaram. O ponto de tráfico que ficava na esquina se mudou para mais longe. Acho que ficaram intimidados com as crianças e com pais vindo participar das atividades – diz o pastor Felix Buava Kila, 42 anos, com um largo sorriso no rosto.

Kila coordena o Projeto Social Geração de Samuel, que funciona na Missão Batista Shekinah, na Avenida Meridional.

Até traficantes procuram vagas para filhos na ONG

Dentro do prédio, cartazes das crianças, frases que ensinam valores e lições de educação e cidadania tomam conta das paredes. No chão, um grupo de 30 crianças de sete a 13 anos tem aulas com uma professora voluntária e com uma oficineira. Nas segundas, quartas e sextas-feiras, o espaço é ocupado por adolescentes, que aprendem noções de cidadania e de informática.

– Um dos meninos trabalhava para o tráfico como aviãozinho (quem leva droga do vendedor ao usuário) para manter o vício em maconha e cigarro. Agora, largou esse trabalho e procura um estágio – relata Kila.

Histórias como essas são frequentes no projeto. Os próprios traficantes, segundo o pastor, batem à porta da ONG pedindo vagas para os filhos – não querem para eles o mesmo destino.


Tribunal do tráfico


– A droga vence quando não há adversário.

A frase repetida pelo psicólogo Leandro Lopez da Silva é como um lema aos especialistas em prevenção à dependência química. E abre o leque de explicações para que a distância entre o uso do primeiro “baseado” e da primeira pedra para a morte esteja cada vez mais curta. Conforme a polícia, pelo menos 70% dos homicídios na Região Metropolitana este ano têm algum tipo de relação com as drogas. A maior parte, de acordo com o delegado Luciano Peringer, vitimados por conflitos entre grupos rivais no tráfico. Invariavelmente, jovens que, atraídos pelo uso do crack, entraram para a quadrilha e não tiveram volta.

– A dívida do tráfico é uma constante nesses homicídios. Um usuário endividado pode se submeter às regras da quadrilha e atuar para ela. Ou vira o alvo dos criminosos – explica.

É que o tráfico se vale da ausência do Estado em uma comunidade para se estabelecer. Um viciado com dívidas facilmente envereda para outros crimes como furtos.

– Matar o usuário é uma forma de manutenção do controle por parte do traficante. O homicídio, para eles, é uma forma de impor respeito – afirma o delegado.

domingo, 18 de novembro de 2012

AJUDA PARA QUEM TRATA DEPENDENTES

18 de novembro de 2012 | N° 17257

CONTRA AS DROGAS



As comunidades terapêuticas interessadas em receber apoio do governo para atender usuários e dependentes de drogas têm até o dia 7 de janeiro para se inscrever no Ministério da Justiça. 


Edital da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas) informa que as instituições responsáveis pelo acolhimento receberão R$ 1 mil por mês, por pessoa, no caso do atendimento de adultos, e R$ 1,5 mil, no caso de crianças, adolescentes e mulheres em fase de amamentação.

Não serão permitidas contenção física, isolamento ou restrição à liberdade das pessoas acolhidas. As internações devem ser voluntárias.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É muito boa esta iniciativa, porém o governo deveria tratar esta questão com mais amplitude e seriedade, construindo Centros Públicos de Tratamento das Dependências em todas a cidades sede de micro-regioes, pelo Brasil afora.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

RESGATE DA DIGNIDADE

 Duas Novidades para o Resgate da Dignidade das Pessoas Usuárias de Drogas e Alcool  

Domingo, 11 de Novembro de 2012 21:26


FELIPE NERI VANI - CAP DA PMSP

Na data de 31 de outubro de 2012, à convite da Prefeita Ana Karin Andrade do Município de Cruzeiro, o Capitão Felipe Neri Vani, Oficial de Comunicação Social do 23° BPM/I, esteve reunido com o Chefe de Gabinete, Magno José de Abreu, com a Secretária de Desenvolvimento e Assistência Social, Ana Cristina Sudário Marques, com o Secretário do Meio Ambiente, Ronaldo Madureira, com o Chefe da Guarda Civil Municipal, Leandro Santiago dos Santos e com a Presidente do Conselho Municipal sobre Drogas, Íris Rodrigues dos Santos.

O objetivo deste encontro era discutir metas para os próximos quatro anos da administração municipal atinente à Segurança Pública, relacionada à prevenção primária, que é vetor de redução da vulnerabilidade do ser humano ao ato delitivo, assim como a Assistência Social.

Para isso, foram discutidos os seguintes trabalhos publicados pelo Capitão Felipe quando Comandante da 4ª Companhia do 23° BPM/I sediada em Cruzeiro:
1. A Polícia Militar de Cruzeiro como vetor de mobilização e mudança social visando a melhoria da sadia qualidade de vida, publicado em 2009;
2. A iniciativa do Comando da 4ª Companhia do 23° BPM/I quanto ao uso das informações contidas em Boletins de Ocorrência da Polícia Militar (BOPM) para encaminhamento de medidas de caráter social no município de Cruzeiro - Um estudo de caso, publicado em 2011 junto ao Executivo Municipal, também denominado de "Despacho Social do BOPM".

Também discutidas as Propostas da Polícia Militar para um Plano Municipal de Segurança Pública elaborado em 2008 pelo Comando de Policiamento do Interior 1.

Ambos os trabalhos do Oficial foram escritos no 5° Prêmio Polícia Cidadã, do Instituto Sou da Paz neste ano, cujo foco são boas práticas policiais que visem a diminuição dos índices criminais, respeitando a lei e aproximando a polícia do cidadão. O Despacho Social do BOPM fora também inscrito no Prêmio Mário Covas neste ano de 2012.

Entre os assuntos tratados, destaca-se:

+ avaliaçao de demandas não criminais constantes nos BOPM, mas os aspectos sociais que motivaram o acionamento da equipe policial militar (chamado pelo rádio, abordagem a suspeito, acionamento pessoal, etc.) e sendo este aspecto a motivação originária do conflito humano que se não tratado, poderá redundar no ato criminoso (aí sim ação de polícia);
+ Espaço Urbano e Criminologia relacionado às lições da Escola de Chicago e a análise das cidades brasileiras;
+ O policiamento orientado aos problemas;
+ Fortalecimento dos Conselhos Municipais de Segurança junto às Associações de Bairros. Para ter noção são necessários 08 (oito) pessoas para se constituir um Conselho;
+ Cursos de Mediadores de Conflitos e Colaboradores de Bairro;
+ Videomonitoramento;
+ Ocupação inteligente dos espaços públicos;
+ Grupo de Gestão de Segurança Pública Municipal;
+ Ações conjuntas;
+ Leis do Fecha Bar e Lei Seca;
+ Fortalecimento dos Orgãos de Assistência Social e dos Conselhos Municipais;
+ Criar Código de Posturas do Município;
+ Convênios com a Policia Militar como Trânsito, Atividade Delegada, etc;
+ Fortalecimento da Defesa Civil e da Guarda Civil Municipal;
+ Criação do Escritório da Qualidade no Executivo Municipal;

Com a implantação destas melhorias, pretende-se fechar o circuito do Resgate da Dignidade Humana, lema da Polícia Militar do Estado de São Paulo, que em todos os rodapés de seus documentos tem descrito "Nós, Policiais Militares, sob a proteção de Deus, estamos compromissados com a Defesa da Vida, da Integridade Física e da Dignidade da Pessoa Humana".

O interesse do Comando do 23° BPM/I é que citado encontro também ocorra em todos os 17 (dezessete) municípios de sua abrangência.

Também foram feitos convites aos presentes para conhecerem a Central de Operações da Polícia Militar (COPOM) em São José dos Campos e a Central de Monitoramento em Aparecida, para que se tomem melhores informações acerca do Policiamento Inteligente da Polícia Militar.

Já em 07 de novembro de 2012, ocorreu na sede do CPI/1 palestra com o Juíz de Direito, Flávio Fenóglio e o Promotor Público Fábio Franco Lima, ambos de São José dos Campos sobre o Projeto Comarca Terapêutica (Saúde na Justiça e Justiça na Saúde, nem descriminalização e nem punição, aproveitando parte da experiência e boas práticas de Portugal, das “Drugs Courts” dos EUA e de outros países, bem como de diversas iniciativas bem sucedidas no Brasil com a área da saúde e com a Justiça Terapêutica), implantado em 03 de outubro de 2012, acerca de nova sistemática aplicada aos usuários de entorpecente envolvidas nas ocorrências apresentadas pela Polícia Militar, consistindo em:

1. Tem por escopo o trabalho horizontal, integrado e em rede do sistema de justiça (Ministério Público, Judiciário, Defensoria Pública e OAB), órgãos de segurança (Polícia Militar, Polícia Civil e Guarda Municipal), Poder Público (Prefeitura, Estado e respectivas secretarias), rede de serviços (saúde, assistência social, educação, cultura, lazer, desenvolvimento social e outros), universidades, CPMA (Central de Penas e Medidas Alternativas) e recursos comunitários (COMAD, ACOD - Associação de Combate às Drogas, entidades de autoajuda, comunidades terapêuticas e associações e lideranças comunitárias);

2. Nos NADQs (Núcleos de Atenção à Dependência Química da Secretaria Municipal da Saúde), é realizada a avaliação psicossocial, orientação, dissuasão e tratamento, de acordo a necessidade e o prognóstico (usuário inicial, abusador ou dependente);

3. Paralelamente, mensalmente é realizada a Audiência de Justiça Terapêutica no salão do Júri da Comarca, na qual dezenas de partes envolvidas com drogas comparecem. São empregadas técnicas motivacionais com a colaboração de representantes de entidades de saúde, de entidades de autoajuda, de ex-dependentes que superaram o vício e universidade (palestras motivacionais, círculos restaurativos);

4. É realizada a audiência individual com o réu e seu familiar e, por meio da reflexão, propõe-se o benefício processual da transação penal ou da suspensão condicional do processo. Com base na avaliação do NADQ, se for o caso, é proposto seu tratamento junto ao este órgão, CAPS-Ad e/ou entidade de autoajuda (facultativo);

5. Mesmo aos dependentes que aceitarem a prestação de serviços à comunidade (e não seu tratamento), é desenvolvido um trabalho conjunto com a CPMA (Central de Penas e Medidas Alternativas) e com as entidades de prestação de serviços para contínua reflexão do usuário durante o cumprimento do benefício. Seus parentes próximos são inseridos no programa de atendimento aos familiares;

6. O projeto prevê a implantação de estandes das Secretarias Municipais no local de desenvolvimento da JUSTIÇA TERAPÊUTICA (saúde, assistência social, educação, inserção e outros). Assim, possibilita-se que os autores, adolescentes e familiares já saiam com as datas dos encaminhamentos e agendamentos de seu programa;

7. Sob o prisma cível o escopo é o mesmo. Com o fortalecimento do projeto e da atuação em rede, advogados, defensores, promotores de justiça e juízes terão plenas condições de encaminhamento de uma parte usuária ou dependente de droga ao NADQ, no bojo de um processo cível ou extraprocessualmente, sempre em um trabalho de reflexão. Há possibilidade de aplicação do projeto nos processos de família, Vara da Infância ou em qualquer procedimento cível com indicativos de que determinada parte ou familiar é usuária ou dependente de drogas, inclusive condicionando determinada medida processual (visitação do filho, por exemplo);

8. Por exemplo, é crescente o número de casos de violência contra idosos, hipótese que o promotor de justiça pode pleitear a medida protetiva pertinente, sem prescindir do encaminhamento do familiar usuário ou dependente. O sistema de justiça não pode se imiscuir do cumprimento de seu papel democrático de prevenção e de tratamento em rede, na medida em que mesmo com a descriminalização usuários e dependentes de drogas continuariam a figurar em milhares de processos cíveis e criminais em todo o país;

Teve sua primeira fase implantada em 03 de outubro de 2012, inicialmente perante o JECRIM (Juizado Especial Criminal), e possui três pilares principais:

a) criação de um grupo e de uma rede articulada intersetorial de atuação de prevenção, tratamento e reinserção;

b) discussão, diagnóstico e criação de novos equipamentos de saúde, sociais e comunitários;

c) novo enfoque do processo cível e criminal e do sistema de justiça na busca da prevenção e do tratamento de pessoas usuárias ou dependentes de drogas.


Os benefícios colhidos com apolítica sobre drogas de determinados países não se deram com a descriminalização, mas com ampla e coesa política de saúde pública, bem como uma integrada e eficaz rede pública, privada e comunitária de prevênção, tratamento e reinserção.








domingo, 11 de novembro de 2012

PRENDENDO PESSOAS ERRADAS


Pedro Abramovay - "Estamos prendendo as pessoas erradas"

O ex-secretário Nacional de Justiça diz que o número de presos por tráfico duplicou porque usuários vão para a cadeia e fala da legalização da maconha aprovada em dois Estados americanos por 


Natália Martino



DOIS PESOS
“No Brasil, a pessoa surpreendida com droga é considerada
traficante, se for pobre, e usuária, se for rica”, diz ele

O ex-secretário Nacional de Justiça Pedro Abramovay é um dos principais nomes da sociedade civil na defesa da descriminalização do uso de drogas. Ele esteve à frente da elaboração de um anteprojeto de lei com esse teor que foi entregue em agosto à Câmara dos Deputados com a assinatura de mais de 120 mil pessoas. Professor da disciplina violência e crimes urbanos na Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV), também coordena o site Banco de Injustiças, no qual registra histórias de usuários enquadrados como traficantes por causa da atual Lei de Drogas, que ele acredita ser falha na definição dos crimes de tráfico e uso de entorpecentes. Abramovay foi um dos coordenadores da Campanha do Desarmamento e trabalhou na regulamentação do Sistema Penitenciário Federal quando era assessor especial do então ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, no governo Lula.


"Há dois ou três anos quem falava de legalização
da maconha era tachado de maconheiro. Fernando
Henrique e Bill Clinton ajudaram a mudar isso”


“A regulamentação parece ter funcionado melhor
do que a repressão. A única droga cujo consumo
diminuiu com políticas públicas foi o tabaco, que é lícito"


Istoé - O que a legalização da maconha, que acaba de ser aprovada em referendo em dois Estados americanos, representa para a política mundial sobre drogas?

Pedro Abramovay - É um marco importantíssimo, principalmente se o governo federal não interferir nessas decisões estaduais. Os Estados Unidos sempre se comportaram como polícia nas convenções internacionais sobre o assunto e, de repente, dois Estados dentro dessa nação que se coloca como guardiã da “guerra contra as drogas” legalizam a maconha. No mínimo, eles perdem a legitimidade para questionar propostas de mudanças que tendem a tirar o problema da alçada exclusiva do direito penal. Abrirá espaço para discussões. Se a estratégia da legalização será ou não positiva, teremos de avaliar com o tempo.

Istoé - Legalizá-la em alguns Estados não pode gerar um turismo de drogas no país?

Pedro Abramovay - Depende da maneira como isso será feito. É importante lembrar que legalizar implica colocar regras, regular a venda, definir idades, impostos, locais de venda. Isso em um campo no qual, na prática, não existem regras há muito tempo. São grandes as chances de um adolescente ter mais dificuldades para comprar maconha em um Estado onde a droga é legalizada – e, portanto, os esforços de controle sobre ela são organizados – do que em outro onde o comércio é todo ilegal.

Istoé - O que pensa da medida tomada pelo Uruguai, que legalizou o uso da maconha, mas seu consumo será controlado pelo Estado?

Pedro Abramovay - Isso nunca foi tentado no mundo. O Uruguai assumiu uma posição de ousadia para tentar enfrentar o problema. Para nós brasileiros é fundamental acompanhar o que está acontecendo lá sem colorações ideológicas. Se funcionar, a gente tem que se despir dos preconceitos e discutir seriamente se essa é ou não uma alternativa viável para o Brasil.

Istoé - Qual a importância de ex-presidentes como Fernando Henrique Cardoso (Brasil), Bill Clinton (EUA) e César Gavíria (Colômbia) defenderem a legalização da maconha?

Pedro Abramovay - É enorme, principalmente porque influencia a mídia. Há dois ou três anos era tabu debater o tema, quem tentava dizer algo era logo tachado de maconheiro. Quando esses ex-presidentes resolveram falar do assunto, chegaram mostrando estudos, pesquisas. Os argumentos já existiam, mas não eram ouvidos. Eles poderiam ter feito isso quando estavam no poder, mas antes tarde do que nunca. Abriram espaço para que atuais presidentes defendessem na ONU mudanças nas políticas de drogas em direção à descriminalização e à legalização. O Juan Manuel Santos, da Colômbia, o Otto Pérez Molina, da Guatemala, e o José Alberto Mujica, do Uruguai, fizeram essa defesa na ONU.

Istoé - A descriminalização total não poderia aumentar o consumo?

Pedro Abramovay - Recentemente foi divulgada uma pesquisa na Inglaterra que analisa 21 países que descriminalizaram o uso de drogas. Em nenhum deles houve aumento do consumo.

Istoé - Há propostas em debate no Congresso Nacional para mudar a Lei de Drogas, que aumentou as penas para o tráfico e acabou com a prisão de usuários. Isso é positivo?

Pedro Abramovay - É preciso uma definição clara sobre quem é usuário e quem é traficante. A lei atual diz que o juiz vai avaliar a partir das circunstâncias sociais para dizer se a droga era para consumo pessoal ou para venda. O que acontece é que, sem critério, uma grande massa nessa fronteira acaba sendo presa como traficante, e colocar essas pessoas na prisão significa entregá-las de bandeja para o crime organizado, que será sua única opção quando saírem da cadeia. Para se ter a dimensão disso, desde que a lei foi aprovada, em 2006, o número de presos por tráfico dobrou. Saímos de 62 mil para 125 mil presos em 2011.


Istoé - Esse número não é uma vitória no combate ao tráfico?

Pedro Abramovay - Resolver o problema das drogas significa diminuir o consumo e a violência relacionada ao tráfico. Nada disso está acontecendo, o que indica que estamos prendendo as pessoas erradas. Mais de 60% dos presos por tráfico carregavam pequenas quantidades, eram réus primários e nunca tinham se envolvido em outros crimes. Não é atrás dessas pessoas que a polícia tem que ir, mas do crime organizado. Para isso, é fundamental que se discutam critérios mais claros para separar quem é usuário de quem é traficante.

Istoé - Que tipos de critérios?

Pedro Abramovay - Vários países adotam a quantidade, não como único critério, mas como parâmetro fundamental para não gerar a situação, que acontece muito no Brasil, na qual a pessoa surpreendida com droga é considerada traficante, se for pobre, e usuária, se for rica. Portugal, República Tcheca, México, Inglaterra, alguns estados australianos, todos esses lugares optaram por esse caminho e têm alcançado resultados melhores que o Brasil, onde a decisão é do policial.

Istoé - Fixar quantidades não facilitaria, para os traficantes, a distribuição de drogas, pois usariam vários “aviõezinhos” que nunca seriam presos?

Pedro Abramovay - A polícia não tem mesmo que ir atrás dos “aviõezinhos”, isso não faz nem cócegas no negócio das drogas. A energia tem que ser revertida para o enfrentamento ao crime organizado e à violência.

Istoé - Se no Brasil está nas mãos dos policiais a decisão, como eles têm feito a distinção entre traficantes e usuários?

Pedro Abramovay - O primeiro critério mais evidente é o de classe. Quando a pessoa mora na favela, o endereço dela é, muitas vezes, sua condenação. Existem decisões judiciais que falam que a pessoa foi flagrada com droga e mora em um lugar dominado pelo tráfico, portanto é traficante. Outras tentam estabelecer critérios mais concretos. Por exemplo, vão dizer que se a pessoa carrega drogas divididas em papelotes, é traficante. Mas, se a droga é vendida em papelotes, ela também é comprada assim.

Istoé - A lei brasileira permite penas alternativas. O Judiciário não reverte os equívocos policiais com elas?

Pedro Abramovay - Muito raramente. O poder Judiciário de primeira instância é muito mais duro nas decisões ligadas ao tráfico do que em outros temas, desrespeitando muitas vezes até decisões do Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, a lei de 2006 inicialmente negava a liberdade provisória em acusações de tráfico e o STF considerou a norma inconstitucional, pois ia contra o princípio da presunção de inocência. Apesar disso, a pessoa acusada de tráfico quase sempre espera o julgamento na prisão e isso já destrói sua vida – ela perde o emprego e fica tachada como traficante. Sem contar que as pesquisas mostram que, quase sempre, os únicos depoimentos levados em conta para a condenação por tráfico são os dos PMs que prenderam o acusado.

Istoé - Mais do que falha na lei, isso não evidencia problemas no Judiciário?

Pedro Abramovay - Quando temos um critério tão subjetivo fica muito difícil para todo o sistema. Tem o policial contando uma história e a família dizendo outra coisa. Em quem acreditar? Todo esse processo é produto da falta de critérios da lei. O Judiciário quer dar respostas à sociedade e prende pessoas que têm problemas com drogas mas nunca cometeram crimes. Colocar essas pessoas na cadeia em vez de tratá-las é uma resposta errada e ineficiente. O problema de drogas deveria ser tratado não como uma questão criminal, mas de saúde. O usuário precisa ser abordado por assistentes sociais, não pela polícia.

Istoé - O nosso sistema de saúde está preparado para essa demanda?

Pedro Abramovay - O Estado já tem a obrigação de tratar o problema de dependência de drogas, a demanda existe, não podemos pensar nisso como um custo novo. A estrutura que temos hoje não está preparada, mas mudar as leis pode provocar o Estado a deixar de esconder o problema e passar a enfrentá-lo.

Istoé - É possível erradicar o trafico?

Pedro Abramovay - É impossível, mas temos de reduzir o consumo de drogas e a violência do tráfico, e isso já sabemos como. Temos que admitir que a criminalização não funcionou. A única droga que teve seu consumo diminuído com políticas públicas foi o tabaco, que é lícito. A regulamentação parece ter funcionado melhor do que a repressão.


Istoé - Como avalia o plano antidrogas do governo federal?

Pedro Abramovay - O Plano de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas tem um cardápio de soluções do qual Estados e municípios escolhem a política a ser adotada. O problema é que dentro desse cardápio tem coisas positivas e outras que podem ter efeitos muito negativos. E não há nada que induza a escolha das opções mais eficientes. Por exemplo, tem uma quantidade importante de dinheiro para consultórios de rua, que funcionam muito bem. Mas tem muito dinheiro para internação, o que pode ser muito perigoso. Em alguns casos, ela é necessária, mas essa não pode ser a principal resposta de tratamento. A internação, para os mais otimistas, tem uma taxa de sucesso de 10%. Não podemos focar todos os nossos esforços em um tratamento que tem uma taxa de sucesso tão baixa.

Istoé - Por que essas taxas são baixas?

Pedro Abramovay - Não basta desintoxicar a pessoa para, como em um passe de mágica, resolver a questão. É algo muito mais complexo e está ligado à relação do usuário com o meio em que ele vive. Se ele está desempregado, não tem apoio da família e seus amigos têm no uso de droga sua principal atividade, as chances de ele se tornar um usuário problemático são enormes. Se ele é internado, desintoxicado e devolvido para o mesmo meio que gerou a dependência, ele vai voltar a usar drogas. A única maneira de acabar com a dependência é trabalhar no meio em que ela está.

Istoé - E como isso pode ser feito?

Pedro Abramovay - Nos consultórios de rua, por exemplo, onde a pessoa pode ir, receber terapia, desintoxicação e ser ajudada, não artificialmente fora do mundo em que ela vive, mas dentro desse universo para que ela possa se libertar das razões que a levaram à dependência. A assistente social pensa maneiras de ajudar o usuário a se reintegrar na sociedade de forma produtiva. Não funciona de uma hora para outra. É um problema no qual não há tiro de canhão. O tratamento é demorado, difícil, mas tem muito mais chances de sucesso do que a internação. Já existem experiências positivas nesse sentido no Brasil, como em São Bernardo do Campo, que tem investido muito no tratamento ambulatorial e no trabalho de assistentes sociais.


quinta-feira, 1 de novembro de 2012

O MÉDICO DERROTADO PELO CRACK


ZERO HORA 01 de novembro de 2012 | N° 17240

DO CONSULTÓRIO À CADEIA

Indiciado pela polícia por cárcere e agressões à namorada, homem arruinou clínica da família por causa do vício em drogas

JOSÉ LUÍS COSTA

O inquérito policial encaminhado ontem à Justiça com o indiciamento do médico Cesar Duilio Gomes Bernardi, 53 anos, por porte ilegal de arma, cárcere privado e agressão a uma namorada, expõe mais um drama familiar impulsionado pelo crack. A prisão do médico – desde o dia 25 ele está recolhido preventivamente no Presídio Central – é o ápice de uma trajetória tortuosa que teve início na adolescência, quando Cesar conheceu a maconha pelas mãos de amigos do bairro Glória, em Porto Alegre.

Eram tempos de estudante nos embalos dos anos 1970, e Cezinha, como era conhecido, trocava beijos nos corredores do Colégio Cruzeiro do Sul com uma colega, uma uruguaia dois anos mais jovem. Desaprovado pelos pais da garota, o namoro não foi longe, mas ele seguiu cada vez mais próximo das drogas. Experimentaria coisa pior: cocaína.

Mais velho dos três filhos de um médico e professor universitário, Cesar cursou medicina na PUCRS, onde se formou em 1988. Era um aluno inteligente, mas não conseguia superar o vício. Por causa da droga, se envolveu em um roubo e acabou preso (leia texto abaixo).

Tempos depois, o clínico-geral foi trabalhar no consultório do pai, na Rua Florêncio Ygartua, no coração do elegante bairro Moinhos de Vento, na Capital. Tinha tudo para dar certo. As quatro salas da clínica viviam apinhadas de pacientes da manhã à noite. O pai caminhava para a aposentadoria e, aos poucos, foi deixando a clínica sob o controle do primogênito. Mas Cesar teria dificuldades de cumprir horários e compromissos. Marcava consultas e não aparecia. A clientela foi minguando, e o médico acabou depenando o consultório para comprar droga.

– Ele vendeu carro em nome da clínica e equipamentos. Fez dívidas que não tinha como pagar – conta um parente.

A família se desfez do consultório em meados de 2005. Teria vendido por valores considerados abaixo dos de mercado. Tinha débitos acumulados, o condomínio estava atrasado e o interior das salas, destruído. O médico passou a atender a domicílio pacientes que o procuravam, esporadicamente, a partir de anúncio na internet. Não vivia mais com a mulher e os dois filhos e foi morar em uma peça com banheiro nos fundos da casa dos pais.

Família dava dinheiro para evitar dívida com traficantes

De personalidade forte, convencia os familiares a lhe dar dinheiro para subir o morro do bairro Glória atrás de drogas. Ali foi apresentado ao crack.

– A gente dava (dinheiro) para evitar de ele ficar devendo. Uma vez, um traficante ameaçou a família de morte – afirmou um parente à polícia.

Cesar teria atraído outras mulheres para seu quarto. Ficariam lá trancados por dias, e ninguém da família podia se meter. Quando era perguntado sobre as visitas, respondia que elas estavam em tratamento de sono. Parentes suspeitam de que elas eram agredidas e fugiam, como aconteceu com a namorada dele, em 19 de outubro. Drogado, o médico se tornava agressivo e não aceitava ser contrariado.

– Ele sempre foi muito independente e nunca conseguimos interná-lo. Sentimos muito o que aconteceu por ele, pela mulher – lamentou um familiar.

Clínico até já assaltou para comprar cocaína

Preso em 1987, quatro dias depois de completar 29 anos, o médico foi recolhido ao Presídio Central de Porto Alegre sob acusação de ter participado de um assalto. O roubo ocorreu em 1983 e teria um objetivo: conseguir dinheiro para comprar cocaína. Julgado pelo crime pela 11ª Vara Criminal da Capital, o médico foi condenado a cinco anos e oito meses de prisão em regime semiaberto. Cumpriu parte da pena no Patronato Lima Drummond, em Porto Alegre, e outra no Presídio de Cruz Alta, para onde foi transferido para prestar serviços, com autorização judicial, no Hospital Militar da cidade.

Espancada, enfermeira foi forçada a se drogar

Em janeiro, o médico Cesar Duilio Gomes Bernardi, 53 anos, reencontrou, quatro décadas depois, a antiga namorada de colégio, uma enfermeira uruguaia de 51 anos (o nome não foi revelado pela polícia). Com a vida estabilizada, separada, mãe de dois filhos, ela também estava morando sozinha. E cheia de energia para reviver o romance juvenil com a disposição de ajudar Cesar a domar o vício e a retomar a carreira médica.

Em maio, o relacionamento engatou de vez, e a enfermeira passou a pernoitar no quarto do médico. E começaram as brigas. No final de setembro, Cesar teria dado uma tapa no rosto da mulher, a deixando com um olho roxo. A enfermeira percebeu que o namoro não ia dar certo, se afastou, mas aceitou voltar, deixando-se levar pelos galanteios do médico.

– Quando não estava drogado, era muito gentil. Ligava, elevava a autoestima dela e a fazia se sentir bem – relata a delegada Nadine Farias Anflor, da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher.

A enfermeira acreditava que o destempero de Cesar não iria além daquele tapa. No começo de outubro, de férias do trabalho em um hospital da Capital, ela pegou uma muda de roupa para passar um dia na casa do médico, mas acabou ficando mais tempo. Na primeira semana tudo estava bem. Ela ia ao banco, à padaria e votou em 7 de outubro.

Mas a partir do dia seguinte, as brigas recomeçaram, e o médico teria proibido a mulher de sair do quarto, intimidando-a, com um revólver que guardava no armário – a arma foi apreendida pela polícia. Cesar teria gastado R$ 2 mil, sacados da conta da namorada, comprando comida, refrigerantes, cocaína e crack.

Segundo relato da vítima à polícia, ela não passava fome, mas apanhou sucessivamente por 10 dias. Conforme a enfermeira, o médico, enfurecido, desferia tapas nos ouvidos dela (golpe conhecido como telefone), socos no rosto e na nuca e furava a palmas da mãos com a ponta de um cortador de unhas. Em uma das brigas, ela teve os cabelos cortados com tesoura. Um chicote e um relho, usados nas agressões, foram apreendidos.

– Um dia ela apanhou de relho até rasgar a pele e desmaiou. Os golpes eram sempre abaixo do joelho para não poder se levantar. Depois, dava doce de leite para ela não ficar anêmica – conta a delegada.

A enfermeira já não tomava mais banho, não trocava de roupa e não tinha forças para se erguer da cama. Três dias antes de fugir, aproveitando que o médico dormia, diz que foi obrigada a experimentar crack para não apanhar ainda mais.


sexta-feira, 26 de outubro de 2012

SUBTERFÚGIO PARA "LIMPEZA SOCIAL"


ZERO HORA 26 de outubro de 2012 | N° 17234.ARTIGOS

Rodrigo Silveira da Rosa *


O tema drogas é relevante e merece uma atenção de todos, principalmente dos governantes, que há muito pecam pela falta de políticas públicas sérias em educação e prevenção. Atualmente, com o crescente e desgovernado consumo de drogas, dentre elas o crack, tem se discutido a necessidade da internação involuntária dos dependentes de drogas, em atenção à Lei 10.216/01, que autoriza sem o consentimento do usuário/dependente o seu tratamento forçado.

A discussão é recorrente e reflexiva, pois recai sobre a constitucionalidade ou não da referida legislação. Isso porque afronta a dignidade da pessoa humana, o direito de ir e vir e de que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, postulados contidos na Constituição Federal. Estas regras são princípios limitadores do Estado no seu poder de punir, em que o dispositivo legal incriminador há de ter como elemento primário a ocorrência de uma lesão ou de um perigo concreto de lesão a um bem jurídico.

E, neste caso, a posse de drogas para uso pessoal é uma conduta que se insere no campo da intimidade e da vida privada, cujo âmbito é vedado ao Estado e, assim, ao direito de penetrar e, sobretudo, intervir. Da mesma forma como não se pode criminalizar e punir, como de fato não se pune em tese, a tentativa de suicídio e a autolesão.

Ao que parece, o Estado a partir de sua ineficiên-cia no tratamento da drogadição e pela ausência de instrumentos públicos adequados, utiliza-se de um subterfúgio técnico para efetuar uma “limpeza social”, visualmente falando, através de internações involuntárias como forma de velar a sociedade do caos que os efeitos das drogas são ante uma política pública ineficaz, que apenas se vale de medidas paliativas para o problema.

A temática debatida envolve diversas áreas, e não é com a repressão, diga-se internação involuntária, que será resolvida, já que, também, não há certeza de um resultado esperado àqueles dependentes obrigados a determinado tratamento. As drogas, sejam lícitas ou ilícitas, sempre farão parte da sociedade, a diferença se apresenta quanto ao tratamento dado a cada substância dentro de uma política pública nacional de drogas que faça a inclusão dessas pessoas novamente, tratando do assunto como um problema de saúde pública.

*Advogado criminalista, especialista na área penal

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Concordo que não pode haver internação obrigatório sem a ocorrência de ilicitude só porque a pessoa é consumidora e dependente de drogas. Entretanto, se esta pessoa dependente de drogas se envolveu em algum ilícito por causa delas, mesmo de menor potencial ofensivo, ou causando ameaça à  integridade familiar, deve sim "mediante ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente" ser internado compulsoriamente, pois envolve não só a saúde, mas também a ordem pública e a segurança de terceiros.

INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA: POR QUÊ?


ZERO HORA 26 de outubro de 2012 | N° 17234. ARTIGOS

Paulo de Argollo Mendes *


Está gerando reações entre apoio e crítica a decisão do prefeito do Rio de Janeiro, Eduar-do Paes, de adotar a internação compulsória para dependentes de crack. O tema pode até ser polêmico, ainda mais que não há uma legislação específica que contemple a medida. Projeto de lei ainda tramita no Congresso, mas parece que a vida dará o empurrão a algo que é urgente. Depois de esvaziar outros expedientes para sensibilizar os usuários, restou às autoridades cariocas buscar uma ação efetiva. Trata-se apenas de acionar mais um mecanismo para alcançar tratamento médico e outros recursos terapêuticos a esses sofridos e doentes seres humanos, a maioria jovens, filhos de classes pobres a ricas.

É preciso colocar esta questão no devido lugar. Primeiro, estamos presenciando a sociedade tomar uma atitude, enquanto o legislador não toma a sua. Certamente, o prefeito está atento ao clamor dos familiares e da população que assistem aos dramas e nada pode fazer, até porque não há um remédio milagroso. Assumir a responsabilidade para si e oferecer hospitais e outras unidades para tratamento desses pacientes garantindo médicos e demais profissionais (que saberão como conduzir os cuidados caso a caso) são obrigações dos gestores públicos da saúde em todas as esferas. Paes dá o exemplo e provoca seus colegas gestores, como os do Rio Grande do Sul.

Depois de mostrar as razões universais que justificam e tornam adequada a internação compulsória, é preciso limpar este terreno de interferências ideológicas e que não têm relação com saúde. A guerra lançada pelo Movimento Antimanicomial no Brasil contra instituições especializadas em tratar portadores de doenças mentais e dependentes químicos só teve dois efeitos até hoje: dizimar a oferta de leitos públicos e jogar doentes à própria sorte, nas ruas, debaixo de pontes. A maioria já morreu, outros estão definhando aos nossos olhos.

Quem erigir a tese de que a medida do prefeito carioca corre risco de assumir contorno higienista deveria observar sua cidade, ouvir mães que acorrentam seus filhos e até mergulhar em presídios. Acabará por flagrar uma nova geração de preconceito e segregação a doentes. Não se pode usar, com interesse suspeito, o cenário do passado, quando hospícios eram depósitos de doentes rejeitados por famílias ou pela moralidade social, até porque eram escassos os recursos terapêuticos para enfrentar a enfermidade. Mais: epidemias de crack não estavam em cena.

Portanto, não se pode imaginar que profissionais de saúde – médicos psiquiatras, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e todos os envolvidos – terão condutas diferentes do que já se verifica hoje em instituições equipadas em cuidar dos pacientes. Uma sociedade democrática como a nossa também não permitiria arbitrariedades, violências. A droga impede o indivíduo de tomar decisões racionais. Compare-se a um bêbado, flagrado em uma blitz da Operação Balada Segura, que acredita estar sóbrio para continuar dirigindo. É preciso impedir à força, com autoridade e prender se for necessário, para proteger a vida dessa pessoa e de outras, até que ela volte a ter condições de raciocinar, mesmo que isso fira temporariamente a liberdade individual.

*Médico e presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers)

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Realmente, se "a droga impede o indivíduo de tomar decisões racionais",  o Estado pode sim "impedir à força, com autoridade e prender se for necessário, para proteger a vida dessa pessoa e de outras, até que ela volte a ter condições de raciocinar, mesmo que isso fira temporariamente a liberdade individual."  A dependência de drogas, além de saúde, é também uma questão de ordem pública, já que esta doença pode levar uma pessoa à morte, ao crime e ser morta pelas mãos do crime se não obedecer as leis do tráfico. Além disto, a família se torna a vítima mais próxima desta ameaça se não conseguir apoio para o tratamento público do ente querido. O descaso do Estado para com as drogas elimina as esperanças do dependente, da família dele e das pessoas que podem vir a ser assaltadas e mortas nas mão de um drogado na busca de dinheiro para sustentar o vício. Sou a favor da criminalização do uso de drogas em público e defendo a internação compulsória para tratamento de dependências para aqueles que usam drogas em público, ameaçam as famílias e cometem delitos sob efeito de drogas ou para sustentar o vício, mesmo que o crime seja de menor potencial ofensivo.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA

 
ZERO HORA 25 de outubro de 2012 | N° 17233

EDITORIAIS


Ao propor uma política pública que prevê a internação compulsória temporária de viciados em crack, o prefeito carioca Eduardo Paes (PMDB) recolocou na pauta do país, esta semana, a questão do tratamento de dependentes químicos. Atualmente, a legislação brasileira permite o recolhimento involuntário de usuários de drogas apenas quando existe autorização judicial baseada em laudo médico que comprove a incapacidade do paciente para conviver socialmente. Na visão de Paes, que nesta quinta-feira terá audiência com o ministro Alexandre Padilha, da Saúde, para tratar do assunto, o dependente de crack não tem condições de tomar decisões, o que justificaria a intervenção do poder público em sua defesa.

A questão é controversa, não apenas por interferir no direito de ir e vir garantido pela Constituição, mas também porque abre precedente para eventuais abusos, como o uso da violência contra drogados, o confinamento e até mesmo faxinas sociais destinadas a livrar habitantes e visitantes dos grandes centros urbanos do convívio com as chamadas cracolândias. A cidade do Rio de Janeiro, que nos próximos meses sediará eventos esportivos internacionais, certamente também tem motivos econômicos e turísticos para tirar os dependentes químicos da sua paisagem.

Admita-se, porém, a boa intenção do governante, que seria garantir tratamento digno e oportunidade de recuperação aos usuários de crack. Para isso, será necessário criar muito mais do que as 600 vagas de internação em regime emergencial anunciadas na última semana pelo prefeito carioca. A internação involuntária só se justificará – no Rio e em outras regiões do país – quando o poder público oferecer atendimento de qualidade, com acompanhamento de especialistas e medicação adequada pelo tempo necessário para a reabilitação.

A proposta do prefeito carioca merece, no mínimo, a atenção do governo federal e do Congresso, onde tramitam projetos semelhantes. A epidemia de crack requer mesmo uma mudança de atitude das autoridades. Só não autoriza uma abordagem higienista, com o propósito de apenas expulsar os doentes do ângulo de visão das demais pessoas, como se eles fossem incômodos a serem removidos. Isso seria um retorno a métodos medievais, como os que levaram à formação de colônias de leprosos em passado não tão distante. O país precisa, sim, livrar-se das suas cracolândias, mas com ações que garantam aos usuários de drogas amplo respeito, tratamento humano, assistência multiprofissional e reais oportunidades para retomarem uma vida saudável e produtiva.

O debate sobre a internação compulsória é bem-vindo, mas a medida só deve ser adotada quando Estados e municípios contarem com centros de reabilitação bem aparelhados e com espaço suficiente para todos os doentes recolhidos.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

RIO NÃO TEM ONDE INTERNAR DEPENDENTES DE CRACK

REVISTA VEJA - 17/10/2012 às 21:39

Blog Reinaldo Azevedo
Análises políticas em um dos blogs mais acessados do Brasil


Caros, vou voltar a este assunto mais tarde. Fiquem agora com uma reportagem da VEJA.com. Que coisa, não é? Então as soluções mágicas não existem nem no… governo Sérgio Cabral.


Viciados em crack fogem da abordagem da prefeitura do Rio (Rodrigo Melo de Carvalho/Divulgação SMAS)

Por Pâmela Oliveira:

Passada a ocupação policial na maior cracolândia do Rio de Janeiro, na região das favelas de Manguinhos e Jacarezinho, o que se viu foi apenas uma mudança de endereço dos pontos de concentração de usuários da droga. E não há, no momento, como ser diferente. Apesar de o poder público ter anunciado o “recolhimento” de mais de 200 dependentes de crack nesses locais, o estado do Rio está, no momento, sem nenhuma clínica onde tratar esses pacientes adultos.

As duas clínicas conveniadas com o estado do Rio, que ofereciam 180 vagas para internação de dependentes químicos no Rio, estão sem contrato com a Secretaria Estadual de Assistência Social desde o dia 19 de agosto. O problema não é só a impossibilidade de realizar novas internações: além de não internar quem é recolhido, os dependentes que estavam em tratamento receberam alta.

Uma das clínicas, ligada à Associação Nova Aliança, em Valença, mantém 18 pacientes dependentes de crack por conta própria na unidade. Já a clínica de Recuperação Michele de Morais, em Santa Cruz, deu alta aos pacientes no fim de agosto. O problema não ocorre por inexistência de verba, mas a falta de uso do dinheiro disponível. VEJA apurou que, até outubro deste ano, o governo do estado havia empenhado apenas 10 milhões de reais dos 29 milhões previstos no orçamento para enfrentar o crack e outras drogas. O que foi efetivamente destinado é apenas 34% do que foi reservado para o ano. As informações estão no Sistema de Administração Financeira de Estados e Municípios (Siafem).

O combate à mais mortal das drogas não é simples. E mesmo com todos os recursos, os profissionais que lidam com dependência química relatam a dificuldade de recuperar os usuários das pedras, vendidas por poucos reais em bocas de fumo espalhadas por cidades do Brasil inteiro.

Desde o último domingo, 259 usuários foram retirados das ruas, mas muitos voltam sem se submeter a qualquer tratamento. Na manhã desta quarta-feira, em meia hora, a Secretaria Municipal de Assistência Social Recolheu 30 dependentes – muitos tinham migrado da cracolândia do Jacarezinho para uma nova cracolândia no Parque União, na altura de Bonsucesso.

O crack recebeu destaque no discurso de posse da presidente Dilma Rousseff. A previsão do governo federal é de, até 2014, investir 4 bilhões de reais em programas de prevenção, tratamento e combate ao tráfico do crack.

Crianças

O município do Rio foi o primeiro a instituir, por decreto, a internação compulsória de menores de idade diagnosticados como dependentes do crack. A prefeitura fez valer, com a medida, o papel constitucional do município de zelar pela infância. Para internar um dependente contra sua vontade em um dos abrigos públicos, basta que a equipe de assistência social identifique que o menor não tem endereço ou responsável localizável. Os abrigos receberam críticas da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e do Conselho Regional de Psicologia, por não apresentarem condições adequadas para o tratamento dos menores.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Não é só a cidade ou o Estado do Rio, mas em todo o Brasil, os Estados e municípios não têm onde internar os dependentes de drogas. Há um descaso generalizado nesta área da saúde que tem seus reflexos no crescimento da violência e da criminalidade.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

DROGAS E O SISTEMA FAMILIAR


ZERO HORA 16 de outubro de 2012 | N° 17224. ARTIGOS


Márcia Pettenon *

A dependência de substâncias psicoativas (lícitas e ilícitas) tem sido tema de debate em vários âmbitos de nossa sociedade. Órgãos públicos e privados vêm discutindo estratégias, realizando estudos e implementando novas formas de intervenções com o objetivo de diminuir a incidência de novos casos.

O uso/abuso de substâncias psicoativas não é um fenômeno atual, no entanto, ficamos impactados, por exemplo, com os índices crescentes de usuários/dependentes de crack em todas as classes sociais. Podemos identificar vários problemas associados à dependência química, como danos físicos e psicológicos aos usuários, gastos públicos com tratamentos, aumento da violência e da criminalidade e graves problemas familiares. Sabe-se que tornar-se ou não dependente químico depende de inúmeros fatores de vulnerabilidade. No entanto, em relação ao ambiente familiar, estudos vêm demonstrando que o tipo de estrutura familiar é considerado tanto um importante fator de risco quanto um poderoso fator de proteção, mesmo que o sujeito tenha alguma predisposição genética.

Existem correntes teóricas que estudam a estrutura familiar de dependentes químicos de drogas ilegais juntamente com seus familiares e apontam que a dependência química é um fenômeno familiar. Isso quer dizer que o uso de drogas estaria sinalizando outros problemas (passados ou atuais) em membros da família. Em relação aos fatores de risco na família, vários estudos com usuários de drogas (legais e ilegais) indicam que existem dificuldades na comunicação entre pais e filhos, conflitos entre os pais (agressões verbais e/ou físicas), ausência de um dos pais ou cuidadores, traumas na infância (abuso sexual e/ou físico) e dificuldades na transmissão de afeto e limites: são frequentes as percepções, por parte dos usuários, de terem recebido afetos rígidos ou negligentes.

Por outro lado, em um ambiente familiar onde os sentimentos são identificados, acolhidos e validados, onde a função/papel de cada membro é desempenhada comedidamente, onde a comunicação é clara (principalmente sobre temas preocupantes como o uso de drogas, a sexualidade etc.) e o sentimento de pertencimento à família é construído de forma que permita a individualização, as estatísticas indicam baixos índices de drogadição.

Quando a família depara com a doença (dependência química), usualmente ainda enfrenta, além de todos os problemas inerentes a esse momento, sentimentos de vergonha e preconceito. A eficiência no tratamento desse problema envolve toda a família, no sentido de resgatar o vínculo familiar, a autoridade dos pais e a autonomia consistente dos filhos. É fundamental ajudar a família a identificar seus pontos fortes e reconhecer as partes vulneráveis que frequentemente têm origem em gerações anteriores e continuam sendo perpetuadas, mesmo que prejudiciais. Neste sentido, a psicoeducação familiar tem sido amplamente identificada como uma das formas mais eficazes no fortalecimento da família e na prevenção de recaídas.


*Psicóloga de família, mestre em Psiquiatria – UFRGS


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - A família tem sim um papel importante através da educação de valores, de comportamento e de defesas preventivas contra as drogas, esclarecendo e acompanhando o familiar pelo amor e não pela obrigação. Porém, estas barreiras não são infalíveis e podem ser  derrubadas no convívio escolar e em sociedade pela pressão dos colegas, namorados(as) e vapozeiros especialistas na sedução de suas vítimas.

São duas as grandes dificuldades dos familiares para enfrentar esta questão: técnicas educacionais para prevenir as drogas na família e o acesso a centros especializados para o tratamento das dependência a tempo de cura. São justamente nestas duas dificuldades que o Estado demonstra seu descaso e jogo de empurra.