Rogério Mendelski - CORREIO DO POVO, 03/06/2012
Como no célebre poema - "Primeiro, eles vêm à
noite, com passo furtivo e arrancam uma flor e não dizemos nada, etc."
-, talvez a sociedade brasileira esteja enveredando para uma situação
semelhante quando não esboça qualquer reação diante da decisão de uma
comissão de juristas que trabalha na reforma do Código Penal, a pedido
do Senado Federal. Na segunda-feira passada, a comissão aprovou a
proposta que acaba com o crime pelo uso de drogas, quaisquer delas -
cocaína, maconha, crack, heroína e tantas quantas existirem no submundo
do crime. A proposta se baseia na "tendência mundial" de desclassificar
como crime não apenas o uso, mas a compra, porte ou depósito para
"consumo próprio". Só existe uma possibilidade de o uso de drogas ser um
crime: quando tiver crianças e adolescentes por perto nas proximidades
das escolas ou em locais de concentração deles. Mesmo assim, em tais
casos, os usuários devem somente ser enquadrados na legislação atual:
advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à
comunidade e o comparecimento obrigatório a programa ou curso educativo.
Isto é, a punição é o enquadramento nos modelares métodos educativos
existentes que o país disponibiliza aos contribuintes. Ironia à parte,
vale reproduzir aqui o que disse o deputado federal gaúcho e médico
Osmar Terra (PMDB) quando soube da decisão: "O caminho de
descriminalizar o uso de drogas é o que vai na contramão do que a
ciência, do que a medicina, de tudo o que as pesquisas apontam. As
drogas, quando formam a dependência no cérebro humano, criam uma nova
rede de neurônios, criam uma nova memória do prazer e é essa nova
memória que leva à dependência de repetir, repetir, repetir pela busca
desse prazer o tempo todo". Para Osmar Terra, a questão das drogas
precisa ser tratada com referenciais na ciência "e não com tratados
filosóficos no ar que não têm base científica e que não têm repercussão
na vida das pessoas". No poema de Maiakowski, depois das flores
arrancadas, da casa invadida, o mais frágil dos invasores "rouba a nossa
luz e arranca a nossa voz". No caso da liberação das drogas, o próximo
passo será, provavelmente, a venda delas em butiques da moda.
IncurávelO
deputado Osmar Terra tem convicção profissional sobre o uso de drogas:
"Elas se transformam numa doença incurável. Não há cura para a
dependência de drogas. Há, sim, o esforço para manter a pessoa em
abstinência. Não há como curar mais isso. A qualquer momento, por alguma
sugestão do ambiente, que aflore aquela memória do prazer da droga, a
pessoa volta e tem uma recaída".
O óbvioSe a
descriminalização das drogas for transformada em lei como sugere a
comissão de juristas, ficará evidente que os consumidores serão
estimulados ao uso. Como não haverá venda legalizada (como na Holanda),
os traficantes terão sua clientela aumentada.
A realidade"A
descriminalização das drogas é o limiar, é a porta se escancarando para
a legalização que vai transformar milhões de brasileiros em dependentes
químicos sem volta. Hoje temos 1% da população dependente do crack.
Isso é coisa gravíssima. Metade dos homicídios no Brasil já ocorre por
conta do crack", alertou o parlamentar gaúcho.
Na contramãoO
país inteiro discute e faz campanhas contra o crack (a próxima parada
após a maconha), que já se tornou uma tragédia nacional. Não há um só
ponto de nosso território que não se consiga uma pedra da droga. A
distribuição, hoje, é o que existe de mais perfeito na logística do
crime, apesar das sanções legais. A liberação do uso para consumo
próprio irá aperfeiçoar ainda mais a gestão dos traficantes.
ComparaçãoO
deputado Osmar Terra defende uma tese: "É preciso ouvir os médicos,
ouvir cientistas, quem pesquisa nessa área nos Estados Unidos, na Europa
e comparar a experiência de Portugal com a da Suécia. Portugal
descriminalizou o uso das drogas e hoje há dez vezes mais pessoas
doentes do que na Suécia, que tem a mesma população e reprime o uso da
droga com firmeza".
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