ARTIGOS
Flávio Tavares*
A extravagância e o absurdo vestem, às vezes, roupa de festa e fingem que aquilo é um baile de gala. É o que ocorre, agora, com a legalização da maconha na República Oriental do Uruguai e a festança que alguns já celebram por aqui, como se a loucura do vizinho fosse exemplo a imitar, e não uma perigosa tolice a evitar.
Engraçado! Proíbe-se propaganda de cigarro na TV e rádio, os próprios maços advertem de que é cancerígeno, já não se fuma em locais fechados e todos concordam em que o tabaco é pernicioso e prejudicial. Mas há quem sugira legalizar a maconha, como se fosse algo benéfico a fazer parte do consumo diário, e não uma droga que cria dependência, nos manipula e provoca mais danos do que o tabaco.
O pretexto (travestido de “argumento”) é que a “legalização” terminará com a violência do narcotráfico. Ou seja: o mal estaria nas criminosas “gangs” do tráfico, não na essência do que é a maconha. A Cannabis em si seria saudável, quase uma dádiva divina, só que pervertida pela disputa violenta entre os traficantes... Esta falácia, ou reles mentira, esquece a essência perversa da droga, que escraviza pela dependência, altera o comportamento e afeta distintas funções orgânicas. A essência é que subjuga – o traficante é apenas o vetor, o transmissor do mal.
E se fosse possível legalizar a propagação do tifo, da aids ou da tuberculose, por acaso elas deixariam de ser doenças temíveis? E se legalizássemos o câncer, terminariam os problemas oncológicos? Estas perguntas absurdas se equivalem à fantasia tola de que a venda e uso legal da maconha põe fim à sua maldade intrínseca.
A Cannabis não é só porta aberta para as drogas pesadas, da cocaína ao crack. Nem só o início de um perigoso romance em que a autodestruição espreita na esquina. O uso aumenta o risco de transtornos psicóticos, provoca ansiedade e agressividade, perda de memória, letargia no raciocínio e na volição. Desvanece o erotismo e está relacionada a depressão e esquizofrenia. É caminho para o transtorno mental definitivo. Portanto, não pode ser encarada como bem econômico de produção, tal qual plantar arroz e soja, criar reses ou fundir aço.
De que lado estamos?
Pode até haver opção entre o bom e o mau, mas não há opção entre o bem e o mal. A neutralidade só existe para as coisas neutras – insípidas, incolores, inodoras e destituídas de sentido.
De que lado estamos? Pode-se admirar ou detestar um livro, uma doutrina ou obra de arte. Pode-se gostar ou não do sabor de um alimento ou de um vinho. Mas – indago – quando vemos à nossa frente o vício e a perversão, a dependência e o delito, devemos escolher de que lado estamos? Ou já sabemos por antecipação, como algo inato?
O pequeno Uruguai equivale à metade do Rio Grande do Sul, tem escassa população e boa escolarização. Assim, não serve de modelo a um país continental em que a vulgaridade ignorante domina boa parte dos nossos 200 milhões de habitantes. Nem é “vanguarda” (como chegam a dizer) por legalizar a droga e criar por lá o Instituto de Regulamentação e Controle da Cannabis, mais um órgão para a burocracia se deleitar, deitar e rolar num país entulhado de inúteis funcionários públicos. É a vitória da “burrocracia”, com dois erres!
De que lado estamos? Convido a todos a pensar. Em especial aos jornalistas e “formadores de opinião”. E até aos políticos, que há muito nada pensam, ou só pensam nas próprias pequenezes.
E a quem não queira pensar, permito-me sugerir um beijo de maconha. Se pousar os lábios num lábio com sabor e odor a maconha, irá acordar-se e vai pensar!
*JORNALISTA E ESCRITOR
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