AMEAÇA LETAL. Laboratório de óxi é descoberto - FRANCISCO AMORIM, ZERO HORA, 31/07/2011
Foi numa casa na área rural de Viamão que a polícia encontrou a evidência mais forte do avanço, no Estado, da droga que assusta médicos e autoridades por ser mais letal do que o crack. O óxi refinado no sítio estourado por agentes do Denarc, na última quarta-feira, era distribuído por traficantes na Região Metropolitana de Porto Alegre
O primeiro laboratório destinado ao refino de óxi no Rio Grande do Sul foi localizado na zona rural de Viamão.
Seguindo os últimos passos de um traficante executado a tiros no dia 16 de julho, o Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) chegou quarta-feira a um sítio em nome do criminoso, onde a quadrilha conhecida como Bala na Cara produzia a nova e devastadora droga para distribuir na Região Metropolitana.
As imagens registradas pelos policiais civis no local onde funcionava o laboratório do tráfico foram cedidas em primeira mão para ZH.
Personagem de uma reportagem no último domingo, o traficante e assaltante Rodrigo Souza da Silva, 25 anos, foi encontrado morto dentro de um porta-malas em Porto Alegre, alvejado com cinco tiros, dois deles na cabeça. Morador da Vila Bom Jesus, ele havia alcançado um dos postos de comando da quadrilha ao se tornar o responsável pelo refino de toda a cocaína, crack e óxi vendido em suas bocas de fumo.
– Ao refinar sua própria droga, a quadrilha se fortaleceu na Região Metropolitana de Porto Alegre. Não é mais uma gangue da Bom Jesus. Passou a competir em preço e também a distribuir para outros bandos menores – explicou o delegado Rodrigo Zucco, da 2ª Delegacia Especializada do Denarc.
Responsável pela investigação, o policial lembra que foi nas mãos de narcotraficantes do mesmo bando, em abril passado, que foi apreendida óxi pela primeira vez no Estado. Mais barata e mortífera do que o crack, a droga foi encontrada no bairro Rubem Berta, na Capital. A Polícia Civil só divulgou que os 360 gramas eram mesmo de pedras de óxi em meados de maio, após confirmação feita por perícia técnica.
– A droga encontrada naquela oportunidade e também em uma outra operação em Sapucaia do Sul tem como origem esse sítio – relata o policial.
Sem se preocupar em ser descoberto na propriedade localizada em Águas Claras – até a conta de luz estava em seu nome –, Silva recebia a pasta-base de cocaína para refino vinda de fora do país. A droga era escondida dentro de canos de concreto enterrados dentro da casa sob um piso de azulejos. Produtos químicos destinados à produção das drogas, como ácidos, solventes, cal virgem e até cimento, eram armazenados separadamente.
– As garrafas de ácidos, por exemplo, eram enterradas no pátio para dificultar a ação da polícia – explica o delegado.
Produção em fogão campeiro
A droga era refinada na cozinha. O local em nada lembra os laboratórios vistos em produções de cinema. O preparo era feito em um fogão campeiro de tijolo. Em um panelão velho de alumínio, a pasta-base era fervida com éter, ácido clorídrico e acetona. Cada quilo acabava rendendo cinco de cocaína pura em pó. Quantidade que era aumentada com a adição de bicarbonato de sódio.
– O que sobrava na panela, o refugo, virava crack ou óxi, voltando para o fogo – diz Zucco.
Se a opção fosse pelo crack, eram usados acetona e ácido clorídrico, entre outros componentes, para se chegar à pedra. Caso o interesse fosse pelo óxi, querosene, ácido sulfúrico – muitas vezes retirado de baterias de carros –, cal virgem e cimento integravam à composição.
– O óxi é vendido como pedra de 2, em alusão ao preço, R$ 2. O consumidor sequer sabe que se trata de óxi. Pensa que é crack – revela o delegado.
A redução de valor que tem atraído consumidores contrasta com a elevação dos danos provocados. Quando o coquetel letal é fumado, além dos estragos provocados tradicionalmente pela cocaína, os aditivos químicos corroem vias respiratórias, pulmões, fígado e rins. Os dentes podem cair. O único estudo sobre o assunto no país, da Associação Brasileira de Redução de Danos, com cem usuários da Região Norte, mostrou que 30% deles morreram em menos de um ano.
AMEAÇA LETAL. Polícia faz a maior apreensão no Estado
Em uma ação realizada, na manhã de sexta-feira, uma equipe do Denarc encontrou três quilos de óxi em uma casa abandonada usada pela quadrilha Bala na Cara na periferia de Viamão. No local, estavam escondidos ainda um quilo de cocaína pura e outro de lidocaína – substância que é adicionada ao pó para aumentar seu volume.
– Já é a maior apreensão de óxi no Estado – afirmou o delegado Rodrigo Zucco.
Há indícios de que o local também já tenha sido usado para refino de drogas. Uma panela deixada dentro de uma churrasqueira com resquícios de cocaína indicam, ao menos, a tentativa de produção. Segundo informações da polícia, a droga produzida no sítio em Águas Claras era levada para a residência na Vila Florença. Dali, era distribuída para as bocas de fumo do bando. Novamente, os narcóticos eram escondidos sob um piso falso.
– Chegamos ao local após uma investigação que prendeu 41 integrantes do bando Bala na Cara – comenta o policial.
A quantidade de óxi apreendida é suficiente para a produção de até 15 mil doses. Como é mais esfarelado do que o crack, é vendido em trouxinhas feitas com papel alumínio, para ser despejado diretamente nos cachimbos improvisados.
A polícia ainda não sabe se existem outros laboratórios na Região Metropolitana. A expectativa, no entanto, não é boa. Outras quadrilhas já habituadas ao refino de cocaína podem estar diversificando sua oferta.
O Denarc agora investiga quem pode ter assumido o lugar de Rodrigo Souza da Silva na produção da droga vendida pela quadrilha sediada na Vila Bom Jesus, em Porto Alegre.
– Ele foi morto porque começou a produzir droga de baixa qualidade. Isso pode ter irritado outros traficantes que adquiriam drogas refinadas por eles – argumenta o delegado.
COMPROMETIMENTO DOS PODERES
As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.
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