COMPROMETIMENTO DOS PODERES

As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

UM FLAGELO QUE SE ALASTRA PELO RS


GEOGRAFIA DO CRACK. Estudo da Confederação Nacional de Municípios aponta que cerca de 90% dos municípios gaúchos registram vício da pedra entre seus habitantes - MARCELO GONZATTO, ZERO HORA 07/11/2011

Um levantamento inédito a ser divulgado hoje pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) indica que o consumo de crack já assola nove entre 10 cidades no Rio Grande do Sul.

As respostas a um questionário sobre o impacto da droga no Brasil revelam que 405 das 452 prefeituras gaúchas participantes do estudo registram o vício da pedra entre seus habitantes – um índice de 89,6%. O estudo também avalia o impacto da dependência sobre áreas como a educação e a segurança pública em todas as regiões do país.

A pesquisa, que será apresentada às 14h30min, na Câmara dos Deputados, em Brasília, demonstra que a droga se universalizou no Estado. Conforme a assessoria técnica do CNM, que no ano passado começou a coletar informações sobre a epidemia tóxica ao lançar o chamado Observatório do Crack, esse é um trabalho mais detalhado em relação a outras iniciativas anteriores.

Até ontem, com base em dados do ano passado, o mapa disponível no site da entidade informava que 377 municípios gaúchos haviam percebido de alguma forma a presença do crack em seu território – mas não especificava se as ocorrências envolviam consumo, tráfico, rota de passagem ou alguma outra modalidade. A partir de hoje, a geografia do entorpecente ganhará contornos novos e mais precisos.

Além de determinar que 405 cidades já registraram o consumo da pedra por meio de serviço municipal como o atendimento em unidades de saúde, a pesquisa informa que em 390 municípios há a circulação dessa e de outras drogas por meio do tráfico.

– Essas informações são alarmantes. Não há parte onde o crack não esteja sendo consumido. Não queremos empurrar o problema para ninguém, mas os governos estaduais e federal deveriam olhar para isso com mais cuidado, porque na situação atual são os municípios que acabam enfrentando o caos nos serviços de saúde – afirma o presidente da CNM, o gaúcho Paulo Ziulkoski.

Relatório mostra que prefeituras têm problemas na área da saúde

O questionário respondido pelas prefeituras também investiga o grau de dependência da população. De acordo com a percepção das autoridades gaúchas, em 242 municípios ele foi descrito como “médio” ou “alto”. O psicólogo Lucas Neiva-Silva, professor da Universidade Federal do Rio Grande e especialista na área de dependência química, afirma que os números condizem com o que tem visto pelo Estado:

– Municípios grandes, pequenos, todos relatam dificuldades para lidar com o crack.

O trabalho completo deverá oferecer informações sobre o impacto do crack em áreas e a escassez de infraestrutura nos municípios para fazer frente à escalada da pedra. Com base nas respostas enviadas por mais de 4,4 mil prefeituras de todo o país, o relatório mostrará que 63,7% delas enfrentam problemas na área da saúde devido à sobrecarga provocada pelo vício da droga.

Em relação à violência urbana, praticamente seis em cada 10 cidades brasileiras apontam transtornos causados diretamente pelo crack – a exemplo de furtos e roubos cometidos para financiar a compra da substância. Um capítulo especial também deverá ser dedicado à relação entre o crack e a situação vivida em escolas do país corroídas pelo consumo do entorpecente, pela presença de traficantes e até de alunos armados.

Exemplo nacional

A CNM considera o modelo e o trabalho da Comunidade Terapêutica Pública Reviver, de Cachoeirinha, exemplos a serem seguidos. Confira a iniciativa:

- Em uma área verde de 11 hectares foi implantado um centro de recuperação para 30 adolescentes, jovens ou adultos.

- Como a estrutura conta com psiquiatra e clínico, quando necessário é possível ministrar medicamentos – o que diferencia a Reviver de outras comunidades terapêuticas, que não usam remédios. O tratamento de nove meses inclui atividades como estudos, oficinas e trabalho.

- Como o atendimento é bancado pela prefeitura, o trabalho é uma forma de contrapartida dos internos à sociedade. Produtos agrícolas vão para a mesa da própria unidade e para creches e escolas municipais. Está em fase inicial uma oficina de jardinagem que produzirá flores para embelezar os canteiros públicos do município.

- A prefeitura de Cachoeirinha é responsável por todo o processo. Uma equipe composta por médico, psicólogo, psiquiatra, enfermeiro, nutricionista, técnico agrícola e assistente social acompanha os internos. O centro de reabilitação foi idealizado pelo prefeito Vicente Pires, 49 anos. Dependente químico recuperado, ele assumiu o projeto como compromisso depois dos problemas que enfrentou por causa das drogas.

- Foram investidos R$ 1,2 milhão para a aquisição da área na Avenida Frederico Ritter por meio de permuta com outras áreas, e R$ 380 mil com a compra de móveis, equipamentos e utensílios. Por mês, o custo de manutenção fica ao redor de R$ 43 mil. Desde abril, apenas cinco internos desistiram do tratamento.

“Morte expõe drama em Rio Grande” - JOICE BACELO

Depois de quase seis anos de luta contra o vício das drogas, a história de Alex da Silveira Mendonça, 23 anos, chega ao final de maneira trágica. No início da manhã de sábado, ele foi morto com um tiro no peito dentro da casa onde morava com a família, em Rio Grande. O autor dos disparos, Romano Marin, 55 anos, era padrasto do jovem.

Para a família, um ato de desespero teria motivado a ação do padrasto, funcionário público aposentado casado há 13 anos com a mãe do jovem. Em depoimento à polícia, Romano Marin disse que disparou para se defender. Em um momento de surto, o jovem teria quebrado equipamentos dentro de casa e tentado agredir a mãe, Wilca da Silveira, 63 anos.

– O Alex foi morto por causa das drogas. O Romano é uma pessoa íntegra, tratava o Alex como filho – disse Dilon Alberto Brião, 60 anos, padrinho de Alex.

Abalada, Wilca não quis falar sobre o caso, mas, por meio de Dilon, mandou um recado: “se o Romano não tivesse feito isso, o Alex poderia ter matado nós dois”.

O padrasto chamou a polícia, entregou a arma do crime e confessou o disparo. Preso em flagrante, foi encaminhado para a Penitenciária Regional de Rio Grande.

Filho único de uma família de classe média, Alex deixa Tales, o filho que completou três anos ontem, no dia de seu enterro.


ENTREVISTA. “Meu filho morreu por causa das drogas”

Pai de Alex, o motorista aposentado Pascoal Mendonça, 52 anos, conta como foram os últimos seis anos na família e lembra do apego que o filho tinha pelo padrasto.

Zero Hora – O senhor acompanhava as crises que o Alex tinha quando consumia drogas?

Pascoal Mendonça – Eu e a mãe do Alex nos separamos quando ele ainda era muito pequeno. Cada um refez a sua vida, mas nunca deixamos o nosso filho de lado. Ele era um guri trabalhador, agora mesmo estava empregado, era auxiliar de mecânica em uma empresa grande. Durante a semana, ele era uma pessoa normal, mas no final de semana saía de si.

Zero Hora – Como foram esses seis anos de luta contra o vício?

Pascoal Mendonça – Ele tinha muito respeito por mim. Sempre que acontecia algum problema, a Wilca me chamava. Estive presente em todas as vezes que tentamos as internações. O Alex sofreu dois acidentes de moto, em um deles esteve à beira da morte, perdeu a carteira de habilitação, até que confisquei o veículo. Faz seis meses que a moto está na minha casa, essa era uma das grandes revoltas do Alex. Sempre que consumia drogas falava disso e brigava com a mãe, queria que ela me convencesse a devolver a moto.

Zero Hora – Como era o comportamento do Alex em casa?

Pascoal Mendonça – O Alex nunca roubou, mas vendia tudo o que tinha, roupas, computador... ele recebeu o salário na sexta-feira, justamente na véspera em que tudo aconteceu. Pelo que eu soube, ele chegou em casa transtornado na manhã de sábado, dormiu na frente de casa e, quando acordou, quebrou o contador e tentou agredir a mãe.

Zero Hora – Qual o seu sentimento em relação ao padrasto do Alex?

Pascoal Mendonça – O Romano (Romano Marin) sempre tratou o meu filho muito bem, tanto que na primeira vez que tentamos interná-lo, ele se abraçou no padrasto e chorou muito. Eram amigos, o Romano chegou a pedir licença do trabalho, certa vez, para cuidar do meu neto, que estava doente. Apesar de não convivermos, sei que ele é uma boa pessoa. O meu filho morreu por causa das drogas.

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