COMPROMETIMENTO DOS PODERES

As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.

domingo, 26 de junho de 2011

AMEAÇADAS PELO TRÁFICO


Ameaçadas pelo tráfico, 2.500 crianças vivem sob proteção no Brasil - O GLOBO, 25/06/2011 às 18h59m; Flávio Freire.

SÃO PAULO - "Teve uma noite que dormi mal porque tinha cheirado muita farinha (cocaína). No dia seguinte eu tava só o pó, me enrolei na contagem dos papelotes e disse pro traficante que na biqueira (ponto de venda de droga) tinha muito mais do que realmente tinha para vender. Fiquei na dívida de R$ 430, não consegui arrumar e o cara foi na minha casa dar a 'letra' pra minha mãe: ou o teu filho paga o que deve ou o corpo dele vai amanhecer na represa". Aos 16 anos, diante da ameaça, Rodrigo (nome fictício) não teve saída, a não ser deixar às pressas a cidade para onde havia se mudado há sete meses, no ABC paulista. Viciado em maconha e cocaína desde os 10 anos de idade, apresentado ao crack aos 13 anos e contratado pelo tráfico no ano seguinte, Rodrigo buscou proteção no poder público municipal, embora ele não esteja na contagem da Secretaria de Direitos Humanos em relação às crianças e aos adolescentes ameaçados de morte, que oficialmente já chega a 516 jovens em 11 estados.

Longe das estatísticas oficiais, como o caso de Rodrigo, o número é ainda mais alarmante: estima-se que mais dois mil meninos e meninas no país estão sob proteção por meio de ONGs e prefeituras, que os encaminham para centros de recuperação distantes de casa. O número oficial de 516 jovens ameaçados consta do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, que ainda envolve 876 familiares sob risco de morte em razão da ligação de um parente com o tráfico de drogas, exploração sexual ou com grupos de extermínio.

Dos que estão sob a tutela do governo, via programa federal, 57% têm envolvimento direto com o tráfico de drogas. Ao serem inseridos, são encaminhados para outros estados nos quais há referência familiar ou levados para casas de apoio, onde podem ficar até seis meses. O perfil dos jovens ameaçados de morte é o seguinte: 70% são negros, 60% têm o ensino fundamental incompleto, 63% vivem com renda familiar inferior a um salário mínimo e 80% têm entre 13 e 17 anos.

- Para entrar no programa, o primeiro passo é o respaldo do Judiciário, de conselhos tutelares ou do Ministério Público, que são as portas de entrada. Depois, avaliar se é caso de ameaça de morte ou de vulnerabilidade social, quando a criança não tem seus direitos respeitados. Constatada a ameaça, verificamos quais o motivo e a circunstância da vítima para saber como proceder - explica a coordenadora nacional do programa, Jerusa Vasconcelos.

Em seis anos de programa, o Rio atendeu 166 crianças e adolescentes ameaçados de morte, além de 150 familiares. Desde o início de 2011, o governo estadual e a entidade responsável pela execução do projeto, a Organização de Direitos Humanos Projeto Legal, estão responsáveis apenas por cinco crianças e três familiares. Em 2006, chegaram a atender 83 jovens e 61 familiares. A verba destinada para o estado em 2010 foi de R$ 1 milhão, com contrapartida estadual de R$ 200 mil.

Segundo Carlos Nicodemos, diretor da entidade, mudanças na forma de atuação do programa explicam a redução do número de atendimento.

- Os recursos foram descentralizados. Antes, saíam do governo federal diretamente para a organização, agora é via governo do estado. O número menor de crianças atendidas é por conta do impacto da descontinuidade que houve no último ano - diz, lembrando que este ano foram feitas 26 solicitações para proteção.

Com orçamento semelhante, a prefeitura paulistana atende hoje 40 garotos. São Paulo é o único município com o qual o governo federal tem parceria, mas o programa deve ser encampado pelo estado até o fim do ano. O grau de ameaças em São Paulo também reforça o drama.

- As ameaças atingem desde crianças que viraram "avião", mas consumiram a droga e não pagaram, até garotos e garotas que não quiseram mais se prostituir para bancar o traficante, fugiram e passaram a ser perseguidos - conta a coordenadora do programa de proteção na prefeitura de São Paulo, Célia Cristina Whitaker. - No caso dos garotos que se envolvem com o tráfico, eles conhecem não só a violência perversa, mas a tortura - diz ela.

Implantado oficialmente em 11 estados - São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Distrito Federal, Pará, Pernambuco, Bahia e Alagoas -, o programa libera verbas a estados e municípios para internação das crianças, mudança dos familiares e políticas de reinserção.

Ainda fora do programa, a região do ABC paulista faz um trabalho paralelo na tentativa de proteger adolescentes. Atualmente, 48 jovens das sete cidades da região estão fora de casa para escapar das ameaças e tentar a reabilitação. Em São Bernardo, a Fundação Criança dá abrigo a 11 jovens.

A relação com o narcotráfico diminui a expectativa de vida desses jovens. O Índice de Homicídio na Adolescência (IHA) mostra que, sem políticas direcionadas, 33 mil crianças que hoje já completaram 12 anos de idade não chegarão aos 18, caso não haja mudanças nas políticas públicas.

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