COMPROMETIMENTO DOS PODERES

As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

ACUADOS PELO TRÁFICO


Moradores e comerciantes dão comida para viciados em troca de segurança - Saulo Araújo e Antônio Machado - CORREIO BRAZILIENSE, 24/08/2011 07:36

A paz de moradores e comerciantes vizinhos às cracolândias não depende somente da atuação das forças de segurança. Acuados, eles passaram a fazer uma espécie de acordo com traficantes e viciados para trabalhar e transitar imunes à perseguição. Dinheiro, comida e até objetos de valor são usados para “comprar” a tranquilidade. É a sociedade, mais uma vez, pagando pela ineficiência do poder público. Em regiões dominadas pelo crack, a situação é dramática. Na quinta e última reportagem da série “A droga que consome Brasília”, o Correio mostra as estratégias da população para driblar a insegurança provocada pela livre circulação de entorpecentes.

Dona de um quiosque na QNN 19, em Ceilândia Norte, Izabel Vilarinho, 65 anos, teve o estabelecimento arrombado 12 vezes nos últimos nove anos. O comércio fica próximo a uma obra abandonada batizada pela comunidade de Castelo de Grayskull — uma referência ao desenho animado He-Man—, conhecido como reduto da criminalidade, como o Correio mostrou em diversas reportagens no segundo semestre de 2010 e este ano. Cansada dos prejuízos recorrentes, ela não só comprou muitos cadeados para fechar o quiosque como passou a distribuir comida aos viciados. “Da última vez que me furtaram, levaram até minhas panelas. No dia seguinte, eu vi um desses garotos drogado com uma delas. A única arma que tenho é oferecer comida para ver se eles ficam menos agressivos”, contou Izabel.

Na quadra ao lado, o proprietário de uma mercearia é outro que adotou a prática da esmola para se ver livre da ameaça de crianças e jovens sob efeito de crack. “Já dei carne, biscoito, chocolate, cigarro e até dinheiro. Vira e mexe, dou R$ 1 ou R$ 2. Ou você faz esse tipo de coisa ou tem de enfrentar a ira deles”, comentou Ailton Araújo Barreto, 44 anos. No centro de Taguatinga, mais precisamente na C-9, o gerente de um restaurante conta já ter perdido mais da metade de sua clientela depois que a rua passou a ser dominada pelo tráfico e pela prostituição. “São dezenas de meninas e meninos drogados, que ficam intimidando os clientes. Muitos pararam de frequentar por se sentirem coagidos. Já baixei o quilo do prato. Quando eles chegam, dou um pouco de comida e peço para ficarem longe. Infelizmente, não vejo outra forma de proteger meu negócio”, lamenta.

Na Rodoviária do Plano Piloto, usuários do transporte público também se incomodam com a abordagem sistemática de um grupo de viciados em crack que passa os dias acendendo pedras no canteiro em frente aos terminais de ônibus. O estudante Fábio Resende Matos, 18 anos, deu o troco que recebeu na compra de um pastel a um adolescente maltrapilho. “Dou logo dinheiro para eles, apesar de saber que vão comprar droga”, disse.

Problema coletivo

Para Maria Fátima Olivier Sudbrack, professora de psicologia da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do Programa de Estudos e Atenção às Dependências Químicas, o medo faz com que as pessoas reajam individualmente, sem organização. Segundo ela, a esmola continua a fomentar o vício.

A professora também avalia que são necessárias atitudes conjuntas do governo e da comunidade para uma integração no tratamento de usuários de droga. “Não é adequado dar dinheiro e comida como se fossem mendigos. Pensar só no umbigo também não é o caso. A sociedade clama por segurança, mas isso não está ligado só ao controle repressor e jurídico e, sim, à saúde e à educação. A comunidade também precisa se organizar”, ressalta.

O professor do Núcleo de Segurança Pública da Fundação Universa George Felipe Dantas avalia que o problema é coletivo. “Os órgãos de segurança pública não conseguem erradicar, sozinhos, o narcotráfico e o consumo de crack em verdadeiras áreas tomadas”, reforça.

Aumento

As estatísticas apontam evolução nas apreensões de crack no DF. No primeiro semestre deste ano, foram recolhidos 35kg da substância ilícita, contra 16kg no mesmo período de 2010, um aumento de 118%. O número de traficantes presos também cresceu. De janeiro a junho, 1,7 mil pessoas foram parar na cadeia acusadas de vender entorpecentes. O de usuários levados às delegacias também cresceu. Passou de 1.739 para 2.296.

O que diz a lei

Consumir ou comercializar drogas no Brasil é crime. Porém, a Lei nº11.343, que está em vigor desde 23 de agosto de 2006, prevê punições distintas a usuários e traficantes. Aos primeiros, a lei estabelece três tipos de pena: advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade (que varia de cinco a 10 meses) e medida educativa de comparecimento a programas ou cursos educativos. Já a quem produz ou comercializa drogas, a legislação atribui pena de cinco a 15 anos de reclusão e pagamento de multa que pode chegar a R$ 1,5 mil. Cabe ao juiz responsável pelo caso definir se a finalidade da droga apreendida é para consumo pessoal ou comercialização. Essa avaliação do magistrados depende de inúmeros fatores, como a natureza e a quantidade da substância e os antecedentes do suposto criminoso.

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