César Augusto Trinta Weber, Médico, mestre e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria/Unifesp - ZERO HORA 25/08/2011
O“como lidar” com pacientes que apresentam doenças clínicas com comorbidades psiquiátricas, entre as quais a dependência química pelo uso do crack, desafia e angustia, cada vez mais, as equipes de saúde responsáveis pelo tratamento desses doentes.
Muitas são as dificuldades, conhecidas e reconhecidas, que elencadas seriam apontadas como justificativas para esse fato. Todavia, todas essas questões estão abrigadas sob um efeito que se poderia chamar de guarda-chuva, ou ainda, em um cenário cujo pano de fundo reflete a saturação dada pelas cores da reforma psiquiátrica.
Em uma ocasião recente, assisti a um psiquiatra fazer uma abordagem geral sobre esse assunto. Reiterou as singularidades das opções terapêuticas para cada paciente, tangenciou as limitações impostas pela reforma à psiquiatria, mas não se esquivou em defender, pelas suas convicções e experiência profissional, a internação hospitalar para o tratamento da drogadição pelo crack.
Não dá para se pensar em formas terapêuticas capazes de enfrentar a epidemia do crack com algum êxito, sobretudo quando está associada a outras doenças – especialmente as infectocontagiosas de incidência e prevalência preocupantes em nosso meio, como a tuberculose e a aids –, se não atacarmos a centralidade desse problema, ou seja, a revisão do modelo de assistência à saúde mental.
Primeiro, é preciso que se entenda que a drogadição é uma doença psiquiátrica e que o crack é a droga da vez. Os efeitos desse substrato da cocaína são responsáveis por reproduzir no cérebro do usuário as percepções do esquizofrênico paranoide. Em surto, comporta-se como um psicótico, colocando a si e a todos os demais em risco, inclusive de morte.
Segundo, que, de um lado, a desintoxicação, a impregnação farmacológica e a psicoterapia são etapas que demandam certo tempo para que os efeitos desejados sejam sentidos. Que, de outro, é imprescindível para a superação do craving (fissura) que medidas de segurança, no âmbito técnico-assistencial, sejam instituídas para evitar a fuga e com ela o retorno ao uso da droga e o consequente abandono do tratamento.
Terceiro, que desconhecer que a família do dependente também adoece e torna-se hipossuficiente para, sozinha, dar conta do cuidado do seu familiar, é tentar negar o poder corrosivo do crack no tecido social.
Enfrentar tudo isso significa dizer que a sociedade precisa participar mais efetivamente dessas discussões e se fazer ouvir ao mostrar que sabe o que é melhor para a sua saúde: dispor de serviços de saúde que garantam a universalidade do acesso, que a atenção ofertada seja integral e resolutiva e, por sua vez, operacionalizada por uma capacidade instalada adequada a complexidade dos agravos a que está sujeita.
COMPROMETIMENTO DOS PODERES
As políticas de combate às drogas devem ser focadas em três objetivos específicos: preventivo (educação e comportamento); de tratamento e assistência das dependências (saúde pública) e de contenção (policial e judicial). Para aplicar estas políticas, defendemos campanhas educativas, políticas de prevenção, criação de Centros de Tratamento e Assistência da Dependência Química, e a integração dos aparatos de contenção e judiciais. A instalação de Conselhos Municipais de Entorpecentes estruturados em três comissões independentes (prevenção, tratamento e contenção) pode facilitar as unidades federativas na aplicação de políticas defensivas e de contenção ao consumo de tráfico de drogas.
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